Estudo sobre Jó 40

O grande poder de Deus (Jó 40.1-41.34)
O ORGULHO DE JÓ É ABATIDO (Jó 40.1-5). Aproximamo-nos agora da resposta humana à palavra divina a qual é introduzida pelo vers. 2. Leia-se: “Porventura contenderá com o Todo-Poderoso o opositor falaz?” Aquele que argúi a Deus responda a estas coisas” (2). Ironicamente Deus tomara Jó à letra e aceitara-o como oponente, como adversário (ver 38.3n.). Terá Jó, o combativo opositor, alguma resposta a dar depois de escutar aquelas impressivas palavras sobre as maravilhas da natureza, tanto animadas como inanimadas, que o Deus da natureza graciosamente lhe concedera? Mas a revelação dos céus transformou o audacioso combatente num humilde adorador. Os capítulos Jó 40.3-5 e Jó 42.1-6 dão-nos uma ilustração clássica dos resultados que devem sempre seguir-se àquele momento em que se quebra o silêncio divino e o Todo-Poderoso se revela de novo ao homem que O escuta naquela atitude de fé sem a qual “é impossível agradar-Lhe”. Nesses momentos interrompe-se a torrente de palavras humanas (4-5); todo o discurso é vão; Jó arrepende-se amargamente das suas lamentações. Nesses momentos o homem vê -se tal qual é: eis que sou vil “eis que nada valho” (4). Não é uma confissão de pecado se bem que Jó não deixasse, por certo, de reconhecer imediatamente a iniquidade de algumas das suas palavras e atitudes. É antes uma confissão da sua insignificância. Ao tirar os olhos de si próprio para os erguer para aquele Deus que agora lhe aparecia mais vividamente do que nunca. Jó via-se a si próprio através de um novo prisma.
As passagens acima mencionadas são altamente sugestivas. A Palavra de Deus operou uma transformação que a palavra humana fora totalmente incapaz de operar. Os capítulos 3 a 37 dão-nos um longo comentário à incapacidade das palavras e sabedoria do homem para explicar o mistério do sofrimento. Elifaz, Bildade, Zofar e Eliú tinham todos feito longos discursos mas sem proferirem uma única palavra que levasse Jó ao arrependimento ou lhe desse um pouco de conforto. As réplicas de Jó também haviam sido impotentes para esclarecer o mistério; também elas haviam escurecido “o conselho de Deus com palavras sem conhecimento” (Jó 38.2 ). Mas veio a Palavra de Deus e a tumultuosa torrente de palavras cessou. Não veio através de argumentos cuidadosamente pensados, irrespondíveis, que, pela sua inexorável lógica, vibrassem um golpe mortal nas objeções e escolhas intelectuais de Jó; não veio através de uma explicação simples, acessível, dos muitos sofrimentos que afligiam Jó. Aí, faz-se silêncio; silêncio acerca da ideia de retribuição tão largamente explorada em discurso após discurso; silêncio acerca do aspecto disciplinador do sofrimento. A Palavra veio daquele Deus poderoso e majestoso que a Jó através de uma visão de Deus-está por detrás de cada maravilha da natureza, seja ela animada ou inanimada, cuidadosamente atento ao inesperado e insignificante (ver especialmente Jó 38.26,27,39; Jó 39.30), infinitamente superior ao homem em poder e sabedoria.
A palavra que assim veio até ele convenceu Jó de que podia confiar num tal Deus. Mostrou-lhe que a Providência era algo de muito mais envolvido e complicado que ele imaginara. Era como um homem que tivesse vivido num quarto fechado cujas janelas cerradas o tivessem privado do puro e doce ar de Deus e lhe ocultassem a radiosa luz do sol. Com o aparecimento de Deus as janelas haviam-se aberto e o ar e a luz haviam entrado. Deus não respondeu aos problemas que se levantavam na sua mente mas respondeu a Jó; curou as feridas do seu coração e invadiu-o de uma doce e quieta resignação. Contudo a Jó não chegou a mais impressiva de todas as palavras divinas, a Palavra que trouxe à humanidade a mais clara e nítida visão de Deus, a mais irrefutável evidência de que Deus é e deve ser digno da nossa confiança: a Palavra da cruz. A visão do Deus da natureza incutiu em Jó o espírito de adoração. Mas quanto maior é a visão do Calvário, quanto mais deve essa visão levar aquele que sofre a prostrar-se humildemente perante o seu Deus numa atitude de profunda admiração, amor e louvor!

Estudo sobre Jó 40.6
O PODER DE DEUS E A ORDEM MORAL (Jó 40.6-14). A ironia que perpassa por todo o discurso divino encontra uma das suas mais fortes expressões na passagem 6-14. Certo comentador vê nesses versos “uma troça tão doce como a que existe no beijo da mãe que se ri do filho”. O vers. 8 pergunta se Jó está disposto a agarrar-se à sua inocência ainda que para a conservar tenha de rejeitar a justiça divina. A questão transfere-se agora da ordem natural do universo (capítulos 38 a 39) para a ordem moral. Possui Jó o poderoso braço de Deus ou há na sua voz autoridade como a Sua? (9). Se assim é, vista-se Jó da majestade e da glória de Deus (10); suba Jó ao trono do universo para daí derramar os furores da sua ira sobre os soberbos e os ímpios (11-13). Só então e nunca até então, poderá Jó julgar inteligentemente a divina ordenação de tudo quanto existe e ouvir o louvor divino. Certo comentador interpreta assim o vers. 14: “Então também eu te louvarei, pois que a tua mão direita te há conquistado a vitória”. Observa este mesmo comentador que a palavra hebraica yadha aqui traduzida por “confessar” é a palavra vulgarmente usada pelo adorador que louva ou dá graças ao seu Deus. Aqui é o Criador que louva a criatura!

Estudo sobre Jó 40.15
BEHEMOTH (Jó 40.15-24). Em Jó 40.15-41.34 temos a descrição de dois monstros: o behemoth, geralmente identificado com o hipopótamo, e o leviatã, geralmente identificado com o crocodilo. A atmosfera da passagem é mais a dos capítulos 38 e 39 que a de Jó 40.6-14. A sua força no argumento é ainda esta: pode Jó assumir o comando da ordem material representada por estas potentosas criaturas? Pois bem: mais gigantesca é a tarefa de combater Aquele que as criou. (Jó 41.9-11). Jó não pode controlar a ordem material; muito menos a ordem moral.
O que o fez o proveu da sua espada (19b). Trata-se de uma frase de sentido um tanto obscuro; é, contudo, possível que se refira às protuberantes presas do animal. Para o vers. 23 adote-se a seguinte tradução: “eis que se um rio transborda ele não treme: permanece calmo ainda que o Jordão suba, tumultuoso, até à sua boca”. Leia-se, em vez de o Jordão, “um Jordão”, isto é, qualquer rio avolumado pelas cheias. O hipopótamo não se encontra na Palestina.