Interpretação de Romanos 4

Romanos 4

Em Romanos 4,  Paulo explora em profundidade os temas da fé, da justiça e da justificação. Aqui está uma interpretação dos pontos-chave em Romanos 4:

1. O Exemplo da Fé de Abraão: Paulo começa apresentando Abraão como um exemplo de fé e justiça. Ele ressalta que Abraão foi justificado pela fé, não pelas obras. Abraão acreditou na promessa de Deus de descendência, embora ele e sua esposa, Sara, já tivessem passado da idade de ter filhos. Esta fé lhe foi imputada como justiça (Romanos 4:3).

2. O Contraste Entre Fé e Obras: Paulo enfatiza o contraste entre fé e obras no contexto da justificação. Ele argumenta que se a justiça fosse baseada em obras, ela seria conquistada e não um dom da graça. Mas porque é baseado na fé, é um dom de Deus, e a graça de Deus é dada gratuitamente àqueles que creem (Romanos 4:4-5).

3. O Testemunho de Davi: Paulo reforça o seu ponto de vista referindo-se ao Rei David, que também falou da bênção de ter os pecados perdoados independentemente das obras. O reconhecimento de David da graça e misericórdia de Deus sublinha o princípio de que a justiça é imputada aos crentes com base na fé (Romanos 4:6-8).

4. A Universalidade da Justificação: Paulo enfatiza que este princípio da justificação pela fé se aplica a todos, tanto judeus como gentios. Ele deixa claro que a circuncisão (um sinal exterior da lei mosaica) não é a base da justiça. A fé e a justiça de Abraão precederam a sua circuncisão, demonstrando que a fé é o requisito essencial para a justificação (Romanos 4:9-12).

5. A Promessa e a Lei: Paulo contrasta a promessa feita a Abraão com a lei dada a Moisés. Ele argumenta que a promessa, que é recebida pela fé, tem prioridade sobre a lei. A lei revela o pecado e traz julgamento, enquanto a fé na promessa traz justiça e vida (Romanos 4:13-15).

6. A Fé de Abraão na Promessa de Deus: Paulo sublinha a força da fé de Abraão. Mesmo quando confrontado com a aparente impossibilidade da promessa de Deus em relação à sua descendência, Abraão não vacilou na incredulidade, mas tornou-se mais forte na fé, plenamente convencido de que Deus era capaz de cumprir o que havia prometido (Romanos 4:18-21).

7. Imputação de Justiça: Paulo reitera que a fé de Abraão lhe foi imputada como justiça, não por causa das suas obras, mas por causa da sua confiança inabalável na promessa de Deus. Este conceito de justiça imputada torna-se uma pedra angular da teologia de Paulo, enfatizando que a justiça necessária para a salvação é creditada aos crentes com base na sua fé em Cristo (Romanos 4:22-25).

Em Romanos 4, Paulo apresenta um argumento robusto para a justificação pela fé, independentemente das obras. Ele usa os exemplos de Abraão e Davi para ilustrar que a justiça é imputada àqueles que acreditam nas promessas de Deus. Este capítulo estabelece a base teológica para os argumentos de Paulo sobre a universalidade da salvação através da fé em Cristo, independentemente da origem religiosa ou étnica de alguém. Ressalta a importância da fé como meio pelo qual os crentes são considerados justos aos olhos de Deus.

Interpretação

4:1-25 A argumentação de Paulo de que somos justificados pela fé, não é algo novo. O objeto da fé para Paulo era Cristo. A explícita apresentação da fé em Cristo como meio de justificação, torna a nova aliança uma aliança eterna. Mas a velha aliança já trazia em si o princípio da justificação pela fé. Quem melhor do que Abraão serviria, por exemplo? Ele foi o pai do povo judeu. Por isso Paulo examina cuidadosamente a sua vida.

4:1. Paulo representa um judeu fazendo a pergunta: Que pois, diremos ter alcançado Abraão, nosso pai segundo a carne? Essas perguntas que Paulo frequentemente apresenta, provavelmente lhe eram feitas nas suas viagens de cidade em cidade.

4:2. Vamos aceitar por um instante que Abraão fosse justificado pelas obras; ele poderia então jactar-se. Sua jactância, entretanto, não seria em Deus, mas nele mesmo.

4:3. O testemunho das Escrituras é a autoridade final para resolver qualquer ponto em discussão. Abraão cria ou confiava em Deus. A crença ou confiança, isso lhe foi imputado para justiça. (Arndt, dikaiosyne, 3, pág. 196; eis 8 b., pág. 229). Aqui Paulo está citando Gênesis 15:6.

4:4, 5. Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e, sim como dívida. Salário vencido não tem ligação alguma com doação. Mas ao que não trabalha, porém crê naquele que justifica ao ímpio, a sua fé file é atribuída como justiça. Aqui, em poucas palavras, está resumida a doutrina paulina da justificação pela fé. Confiança constante ou entrega a Deus é o primeiro e único requisito do homem, que é justificado. Para os judeus isso era um escândalo de proporções não desprezíveis. Não podiam aceitar que Deus pudesse absolver um homem culpado, ímpio. Duas coisas eram desprezadas pelos judeus que se opunham a isto, como se fosse um libelo contra a essência de Deus. Primeiro, os judeus rejeitavam Jesus como Messias, e, portanto, eles menosprezavam a transação redentora que envolvia Deus e Cristo. Segundo, falharam em compreender o significado da crença ou confiança da parte daquele que era ímpio. Tal confiança mostra que o homem já não é mais um indivíduo sem Deus, mas antes uma pessoa que se entregou a tudo o que Deus é, a tudo o que Deus fez, e a tudo o que Deus fará.

4:6-8. Davi também fala de como é bem-aventurado (feliz) o homem a quem Deus atribui justiça independentemente das obras. Com isto confirma a afirmação anterior feita sobre Abraão. Na citação de Sl. 32:1, 2, fica claro que a justificação creditada a um homem, é colocada em sua conta. Descreve-se essa mesma pessoa tendo perdoados seus feitos ilegais e cobertos os seus pecados. O Senhor não coloca o pecado em sua conta. Em lugar de um débito que jamais conseguiria pagar, ele recebe a justificação em sua conta, justificação essa que nunca mereceu. Como pode um homem ser justificado diante de Deus? Deus concede a Sua justiça àqueles que confiam nEle (Fp. 3:9). O V.T. afirma que Deus o faz. O N.T, mostra mais claramente como Ele o faz.

4:9-12 Se o caso de Abraão é uma ação judicial que põe à prova a constitucionalidade da lei, como a sua fé se relaciona com o rito da circuncisão? Ele foi o primeiro a participar desse rito, e este se tornou o sinal da aliança de Deus com o Seu povo. Com toda certeza essa pergunta era feita em toda discussão que Paulo tivesse com os judeus.

4:9, 10. O apóstolo insiste que o crédito da fé para a justificação teve o seu lugar antes da circuncisão de Abraão. Na verdade, a circuncisão é considerada nas Escrituras como o sinal da circuncisão como selo da justiça da fé (v. 11). Conclui-se que a circuncisão foi um sinal dado a Abraão da justificação, que Deus lhe concedia por causa de sua confiança. Uma vez que a fé e a concessão da justificação ocorrem antes da circuncisão, Abraão é o pai dos gentios que, creem, mas que não têm este símbolo religioso. A ordem no caso de Abraão – fé e depois o crédito da justificação – torna inequivocamente claro que a justiça pode ser computada aos gentios que creem, O fato da circuncisão ser um sinal de justificação concedida a Abraão por causa de sua fé, faz de Abraão também o pai dos judeus, os quais – como ele – receberam a circuncisão, exerceram a fé, obtiveram a justificação concedida por Deus, e consideram a circuncisão como o sinal desta fé e justificação.

4:12. Observe que Abraão não é o pai (num sentido espiritual e vital) daqueles que só têm o sinal externo; mas, antes, ele é o pai daqueles que andam na fé, que ele teve antes de receber qualquer sinal exterior. Os judeus deviam andar nas pegadas de Abraão, o homem da fé, não nas pegadas de alguém que legalistamente realizasse um rito que Deus tivesse ordenado.

4:13-16 Paulo assevera que a promessa foi dada a Abraão ou sua semente, não por intermédio da lei. Que promessa Paulo tem em mente? É a promessa de que ele, Abraão, havia de ser herdeiro do mundo. Esta linhagem exata não se encontra no V.T., mas certamente Paulo fala aqui de Abraão como o pai de uma grande descendência (Gn. 15:5,6; 22:15-18). A grande quantidade da sua semente – como as estrelas do céu e a areia ao longo da praia (Gn. 22:17) – era entendida pelos judeus como se referindo apenas aos seus descendentes físicos. Mas em Rm. 4:11 Paulo diz que Abraão é o pai daqueles que creem entre os gentios - “aqueles que creem estando na incircuncisão”. Por isso Abraão é o herdeiro do mundo, porque ele é o pai dos crentes. Esta promessa é mediante a justiça da fé. É claro que a fé realmente não concede a justiça. Deus a concede com base na fé.

4:14 E se nós presumirmos que aqueles que são da Lei são herdeiros? Anula-se a fé e cancela-se a promessa. Sempre que a escolha recai sobre a fé ou a lei, então a escolha da lei (legalismo) como base da herança do mundo e maneira de agradar a Deus, significa abandonar a fé e a promessa que nela se baseia.

4:15 A lei suscita a ira. Ela o faz estabelecendo um padrão divino de conduta. Os homens que ignoram esse padrão e fazem o que querem, colocam-se diretamente sob a ira de Deus.

Mas onde não há lei, também não há transgressão. Ninguém normalmente seria acusado de excesso de velocidade, se o estado não tiver um limite de velocidade, e se não houver sinais de limite colocados ao longo da estrada, e se não houver nada que pareça irrazoável e impróprio naquele que está dirigindo. A palavra transgressão (parabasis) refere-se a uma infração, uma violação de ordem específica. O papel da Lei, então, é o de esclarecer o que Deus exige dos homens.

4:16 Essa é a razão por que (a promessa) provém da fé. A promessa tem sua fonte na fé a fim de que todos saibam, que o conteúdo da promessa é um favor, não coisa merecida, que venha em retribuição de algo. Mais ainda, a promessa é garantida para toda a descendência. Paulo esclarece que a posteridade não deve ser restringida àqueles que viveram sob a Lei. Antes, a posteridade refere-se 'aqueles que, tal como Abraão, creem em Deus – aqueles que participam da fé de Abraão. Se esta é a definição da palavra descendência, então Abraão é realmente pai de todos nós.

4:17-25 Nesta parte o leitor vê o Deus em Quem Abraão creu. Também fica sabendo que obstáculos e dificuldades Abraão venceu por causa de sua firme confiança. Ambos, Abraão e o Cristão, partilham da mesma convicção: Deus dá vida aos mortos.

4:17 Um ano antes de Isaque nascer, Deus reapareceu a Abraão, reenfatizando Sua aliança com ele, dizendo que seria o pai de muitas nações, e mudando o seu nome de Abrão para Abraão (Gn. 17:1-5). O apóstolo cita a frase, Por pai de muitas nações te constituí. Paulo descreve Abraão, no momento em que esta declaração foi feita, perante aquele (Deus) no qual creu. Duas coisas importantes foram ditas sobre o Deus em Quem Abraão creu: 1) Ele vivifica os mortos. Abraão experimentou este poder no nascimento de Isaque (cons. Rm. 4:19). Paulo estava pensando no Pai especialmente como Aquele que ressuscitou Cristo (cons. v. 24). 2) chama à existência as coisas que não existem. Este é o poder do Senhor para criar. Também poderia ser traduzido assim: Deus cria o que não existe como se existisse. Nenhum mortal pode compreender o poder criativo de Deus. A criação dos objetos animados e inanimados e a sua conservação é a atividade de Deus. A natureza dos objetos pode ser discutida – mente, matéria, energia – mas o porquê e como de sua existência, só pode ser exatamente conhecido até onde o Senhor revela.

4:18 Conhecendo Abraão um Deus assim, ele era capaz de crer, em esperando contra a esperança. Sua fé foi dirigida para o propósito e alvo de ser o pai de muitas nações.

4:19 Havia dois grandes obstáculos na consecução do seu alvo. Ele era fisicamente incapaz de gerar um filho. Sua esposa Sara era fisicamente incapaz de conceber e dar à luz. Mas ele sem enfraquecer na fé, embora levasse em conta o seu próprio corpo (considerando-o) amortecido (v. 19). Ele não considerou o seu próprio corpo já morto. Mas esta negativa não é sustentada pelos melhores manuscritos. Portanto, Paulo descreve Abraão enfrentando a dificuldade. Ele tinha cerca de cem anos de idade. Ele considerou mais a morte do ventre de Sara.

4:20 Não duvidou da promessa de Deus, por incredulidade. A palavra que foi traduzida para “duvidou” (diakrino) poderia ser também “oscilou”. Para o patriarca, não havia incerteza por causa de incredulidade. Em face desses obstáculos, Abraão se fortaleceu na fé ou confiança. Observe aqui os efeitos da crença e descrença. A incredulidade põe a pessoa em discordância com ela mesma; a crença produz força para enfrentar o obstáculo. Abraão deu glória a Deus conforme foi fortalecido.

4:21 Ele estava convencido de que o que ele (Deus)... prometera, era capaz de realizar. O verbo “prometer” está no perfeito. Isto significa que Abraão estava na posse da promessa, tão grande era sua convicção de que a promessa se realizaria.

4:22. Este era o tipo de fé creditado a Abraão como justiça.

4:24. O crédito da fé como justiça, não foi só para o benefício de Abraão. O registro deste fato foi por nossa causa. A justiça será computaria àqueles que creem naquele que ressuscitou dentre os mortos a Jesus, nosso Senhor. Há uma diferença entre Abraão e o Cristão. Abraão creu ou confiou em Deus (v. 3). O Cristão confia no mesmo Deus, mas agora Ele é conhecido como o Deus que ressuscitou Jesus Cristo dos mortos (v. 24). Nisto o Senhor revelou-se agindo em benefício do homem de um modo todo especial.

4:25. O centro de sua ação é Cristo, o qual foi entregue por nossas transgressões. O verbo “entregar” está na voz passiva, significando que foi Deus que o entregou (cons. 8:32). A mesma palavra foi usada com Judas e sua traição. Mas embora Judas fosse o instrumento humano, que entregou Cristo aos soldados, e embora o pecado de Judas fosse muito grande, era propósito de Deus que Cristo fosse entregue nas mãos dos pecadores. (A palavra “entregou”, paradidomi, é usada em diversos contextos interessantes. Para um estudo dessa palavra veja F. Buchsel, TWNT, II, 171.175; Karl Barth, Church Dogmatics, Vol. II, Parte 2, The Doctrine of God, págs. 480494).

Quando vemos que “nossas” transgressões exigiram que Cristo fosse condenado à morte, a morte de Jesus aparece numa luz diferente. Um observador neutro poderia concluir que Cristo morreu e ressuscitou. Mas alguém que se entregou a Deus diz: “Jesus foi entregue por causa das minhas transgressões”. O pronome plural nossas mostra a identificação de Paulo com seus leitores romanos.

Ressuscitou por causa da nossa justificação. O verbo está novamente na passiva. Deus ressuscitou Cristo dos mortos. Aqui se diz que a ressurreição foi essencial para sermos justificados. A ressurreição assinalou não somente a vitória de Cristo sobre a morte mas também sua vida testifica que Ele completou a obra redentora que foi planejada por Deus (a obra para a qual Ele se tornou homem), e que Ele vive para rogar pela causa daqueles que crêem nEle e na Sua obra redentora.

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