Evangelho de Marcos — Data e Lugar da Escrita

Evangelho de Marcos — Data e Lugar da Escrita

Evangelho de Marcos — Data e Lugar da Escrita  


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Os mais antigos testemunhos acerca do Evangelho de Marcos ligam-no com a pregação de Pedro em Roma na sétima década da era cristã.

Papias (c. 115 d.C.), segundo citação de Eusébio (375 d.C.) (1), diz:

E o Presbítero João, também disse isto, sendo Marcos o intérprete de Pedro, escreveu tudo que dá registo com grande exatidão, mas não, no entanto, na ordem em que foi falado ou realizado por nosso Senhor, pois ele nem ouviu nosso Senhor nem andou com ele, mas, como foi dito antes, estava em companhia de Pedro, lhe deu as instruções necessárias, mas não deu a história dos discursos de nosso Senhor; por conseguinte, Marcos não errou em nada, ao escrever algumas coisas, como as registou, pois era muito atento a uma coisa, não omitia nada do que ouvia, nem afirmava nada falso nos seus relatos.

Eusébio (2) citou também Clemente de Alexandria (c. 180 d.C.) notando o fato de que os ouvintes de Pedro insistiram com Marcos para que deixasse um memorial da doutrina que Pedro tinha transmitido oralmente e que Pedro autorizasse que o Evangelho fosse lido nas igrejas. De Orígenes, sucessor de Clemente (c. de 225 d.C.), diz-se ter dito que Marcos escreveu o seu Evangelho como Pedro lho ia explicando (3).

Ireneu confirmou esta tradição, dizendo que “depois da morte de Pedro e Paulo, Marcos nos transmitira por escrito as coisas pregadas por Pedro” (4). Pode-se discutir a confiança que podem merecer estas tradições, visto não virem diretamente do primeiro século, mas é digno de nota a concordância de todas elas quanto ao fato de ser Marcos o autor do segundo Evangelho e também de todas elas o ligarem à pregação de Pedro. As tradições estão em desacordo a respeito da relação do Evangelho com o tempo da vida de Pedro. Ireneu dá a entender que o Evangelho foi escrito depois da morte de Pedro, presumivelmente entre 65 e 68 d.C., enquanto que Clemente e Origens afirmam qu ele foi acabado ainda em vida de Pedro e autorizado por ele. Não pode haver dúvida de que este Evangelho foi produzido por um homem que conheceu alguém da comitiva apostólica e que teve longo e direto contacto com a respectiva pregação.

Podemos fazer algumas deduções dos fatos precedentes:

1 . Marcos foi criado na atmosfera religosa do Judaísmo.

2. Pode ter sido testemunha ocular de alguns dos fatos registados no Evangelho que tem o seu nome.

3. Foi cooperador íntimo dos dirigentes apostólicos da primitiva igreja e deve ter-se familiarizado completamente com a sua pregação a respeito de Jesus e com as “boas novas” que eles propagavam.

4. Ele próprio participava no trabalho da pregação e testemunhava o começo da missão gentílica.

A estes fatos podem-se juntar mais um ou dois deduzidos do Evangelho:

1. O autor punha em relevo fatos e não temas ou tópicos.

2. Foi talvez testemunha da prisão de Jesus no jardim. Em Mc 14:51 e 52 é mencionado um jovem que seguia a Jesus. Não é dada idéia da sua identidade nem da sua colocação aqui, nem esclarece nada na seqüência da obra. No que diz respeito à narrativa, a omissão de referência a ele não quebraria a sua continuidade. E difícil resistir à tentação de ver aqui a reminiscência duma experiência vivida do autor, mas sem importância para a linha principal da narrativa. Nenhum dos outros sinóticos refere este caso. Se este passo se refere a Marcos, então ele foi uma testemunha ocular das últimas horas da vida de Jesus, e é muito provável que a posteridade lhe deva muito do que se sabe dessas últimas horas.

3. E importante também, em Mc 15:21, uma referência a Simão Cireneu, “pai de Alexandre e Rufo”. Estes dois homens não têm parte na narrativa; são mencionados só aqui. Por quê? Provavelmente porque eram conhecidos do autor e dos seus leitores, como relações pessoais. Se é assim, a data do Evangelho deve ser colocada dentro de uma geração da cruz, mas se se admitir que estes homens fossem crianças quando ocorreu a crucificação.

4. Um outro fato interessante emerge duma comparação do discurso de Pedro em At 10:34-43 com este Evangelho. A tradição afirma que Marcos foi ajudante de Pedro durante algum tempo, e há uma certa confirmação disso em 2 Pe 5:13. E digno de nota que o sermão de Atos siga tão Intimamente o esboço do conteúdo de Marcos. Marcos, como o afirma a tradição, não teria registado no seu Evangelho a pregação oral de Pedro?

Destas considerações pode concluir-se que este Evangelho é obra de um ou mais jovens pregadores da idade apostólica que estava inteiramente familiarizada com a mensagem a respeito de Jesus e que a escreveu como a tinha ouvido, sem elaboração ou embelezamentos de qualquer natureza. Não tentou fazer uma interpretação biográfica; limitou-se a fazer os fatos falarem por ele. Se fosse escrito pelo fim da sua carreira, a sua própria experiência teria aprofundado e enriquecido a sua apresentação da mensagem a respeito de Cristo.

A discussão precedente a respeito do autor já abarcou muitas das evidências existentes quanto à data do Evangelho. Dificilmente teria sido mais tarde do que 70 d.C., e pode ter sido composto consideravelmente mais cedo, se por “composto” se entende a coleção e uso de material, mas não necessariamente a sua publicação. A íntima concordância de Marcos com Mateus e com Lucas, onde (nestes dois últimos) se pode encontrar a maioria das matérias de Marcos, tem levado muita gente a pensar que Mateus e Lucas tenham usado Marcos como fonte de informação e que o documento escrito deve ser de data anterior aos outros dois sinóticos. Esta conclusão obrigar-nos-ia a crer que, ou Marcos seria mais primitivo do que se pensa ou os outros mais tardios do que se crê. Se, no entanto, estes Evangelhos são três diferentes apresentações escritas da mensagem apostólicas acerca do Senhor Jesus Cristo inspiradas pelo Espírito Santo, tiradas do material comum que os apóstolos e os seus cooperadores pregavam, há uma boa possibilidade de que tenham sido produzidos simultâneamente. Para uma discussão adicional do assunto, vede a secção sobre o Problema Sinótico no capítulo XI.

O Evangelho de Marcos é conciso, claro e direto, estilo este que agradaria á mentalidade romana, que não gostava de abstrações e fantasia literária. Há muitos latinismos em Marcos, como Modius para “alqueire” (4:21), census para “tributo” (12:14), speculator para “executor” (6:27), centurio para “centurião” (15:39,44,45) e outros. Para a maior parte destes termos havia equivalentes gregos. Parece que Marcos usou termos latinos por serem mais comuns e mais familiares. Este Evangelho insiste pouco na lei e nos costumes judaicos. Quando os menciona, explica-os mais completamente do que os outros sinóticos. A evidência interna do Evangelho adapta-se admiravelmente bem à tradição externa que diz ter sido Roma o lugar da sua publicação. De qualquer modo, Marcos era apropriado para o leigo de mentalidade romana prática que estava ainda por evangelizar.


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NOTAS
(1) Eusébio: Historia Ecclesiae, III, 39.
(2) Op. cit., II, 15.
(3) Op. cit., VI, 25.
(4) Ireneu: Adv. Haer., III, i, II.