Estudo sobre Isaías 14
Isaías 14
14.1, 2. Até mesmo nesse breve texto, podemos ver o duplo quadro de referência; se o primeiro pensamento de Isaías era a restauração do Reino do Norte, no contexto mais amplo precisamos entender Israel no sentido mais amplo; quando os impérios dos homens forem finalmente derrubados, todo o povo de Deus vai ser restaurado. O v. 2 é simbólico em parte, retratando a virada na situação contra antigos opressores. O propósito de Deus para os pagãos não era a aniquilação total, pois alguns se juntariam a Israel na verdadeira adoração de Deus; esse tema, presente mas raramente destacado no AT (v., no entanto, 56.6ss), é uma doutrina importante no NT.
14.3-21. E importante perceber que esse poema não está em linguagem simples de descrição em prosa, mas é um escárnio altamente ilustrado, uma paródia do lamento. De forma intensamente sarcástica, o profeta faz de conta que está sentindo tristeza pelo rei morto e que está levando a sério as reivindicações de status divino que foram feitas pelos reis da Assíria e da Babilônia (v. 12ss). O rei é saudado como estrela da manhã, filho da alvorada (v. 12), uma frase que o torna equivalente a uma deidade adorada pelos cananeus, e sem dúvida conhecida de nome pelo povo de Judá. (O termo “Lúcifer” [VA] também é uma referência à estrela da manhã; é incompatível com o texto pensar que aqui há uma referência a Satanás.) O monte da assembleia, no ponto mais elevado do monte santo (v. 13) é uma referência ao equivalente cananeu do monte Olimpo na Grécia, a moradia dos deuses. Assim, o rei é retratado como uma deidade resplendente — mas uma que, como a estrela da manhã a cada novo dia, desaparece rapidamente e se torna insignificante e é esquecida! Ele cai de ponta-cabeça da altura do poder e da aclamação humanos até o túmulo — e além dele. Se buscarmos um contexto histórico específico para este cântico de escárnio, a morte de Sargão II (705 a.C.) parece particularmente apropriada, pois ele morreu em batalha longe da Assíria e foi sepultado longe da sua capital. Assim, o seu funeral não teve a pompa e a cerimônia concedidas até mesmo a reis menos importantes dos seus dias (cf. v. 18,19). O evento serve para simbolizar uma realidade mais profunda. No Sheol (v. 15, ou “sepultura”, que aqui como em outros textos é um tipo de combinação entre a sepultura em Sl e a vida após a morte; cf. especialmente v. 9,11), o rei morto e humilhado é objeto de admiração (v. 16). O ponto destacado é o contraste entre sua glória passada e sua humilhação final, entre o aplauso deste mundo e o juízo de Deus; cf. Lc 16.19-31. O profeta ainda destaca mais dois pontos. Ele chama atenção para a alegria e a paz que segue a morte do tirano (v. 7); até mesmo as florestas do Líbano (v. 8), tantas vezes saqueadas por sua madeira pelos conquistadores assírios, agora estão em paz! A esperança dos prisioneiros (v. 17) exilados é por implicação associada com esse tema; essa característica do poema aponta novamente para Sargão, que havia conquistado Samaria em 722 a.C. e se vangloriou do número de exilados deportados de Israel.
O segundo ponto dá o tom com que termina o poema: e o tom é que tal tirania inevitavelmente traz desastre, no final das contas, sobre a própria nação do tirano (v. 20,21). Tanto a Assíria quanto a Babilônia pereceram assim, uma depois da outra.
O poema, então, embora escrito como celebração da morte de um tirano específico, se revela e pode ser lido como uma predição da queda de qualquer tirano humano e de seu destino na vida após a morte. Sictransit gloria mundi.
14.22-27. Ambas as grandes potências da Mesopotâmia são objeto da condenação do profeta, nesse parágrafo final do oráculo contra a Babilônia. Em primeiro lugar, temos uma referência à própria Babilônia (v. 22,23) num breve resumo de 13.17-22 em prosa. O oráculo final (v. 24,25) vem novamente em poesia e prediz a derrota do exército assírio na terra de Israel; essa promessa deve ter dado muita esperança a Judá durante o período final do ministério de Isaías. Ela foi parcialmente cumprida em 701 a.C. (cf. 37.36,37), mas o jugo assírio não foi aliviado antes do final do século VIL No entanto, os últimos dois versículos de toda a seção (13.1—14.27) colocam as promessas específicas dos v. 24,25 no contexto mais amplo do propósito de Deus para toda a terra. Por isso, o povo sofredor de Deus precisa ter paciência; enquanto isso, eles podem ter certeza de que nenhuma potência imperial pode impedi-lo.
Acerca dos filisteus (14.28-32)
A atenção do leitor é desviada agora dos impérios da Assíria e da Babilônia e dirigida para uma série de Estados menores nas vizinhanças imediatas de Judá. A Filístia merece um oráculo breve e um tanto enigmático de Isaías. Acaz era pró-Assíria na sua política externa, mas o seu sucessor Ezequias não foi, e assim logo após a morte de Acaz (v. 28) os filisteus enviaram uma delegação (emissários, v. 32) para tentar atrair o apoio de Judá numa confederação contra os assírios. O v. 29 parece sugerir que um rei assírio (uma vara que feria os filisteus) tinha morrido recentemente; mas o profeta adverte que os futuros reis e exércitos assírios — descritos numa série de imagens caleidoscópicas — serão ainda mais cruéis no tratamento dado à Filístia. (Acerca de víbora e serpente veloz, cf. D. J. Wiseman, Tyndale Bulletin 23, 1972, p. 108ss.) Assim, a Filístia está condenada em virtude de sua política anti-Assíria; mas Judá pode descansar feliz como um refúgio (v. 32) ordenado por Deus em que o pobre e os necessitados serão bem tratados (v. 30). A implicação é que Judá precisa evitar qualquer envolvimento com a política dos filisteus. Encontramos então mais uma vez Isaías aconselhando fé em Deus e demonstrando a sua desconfiança em relação a alianças políticas. A data da morte de Acaz não está claramente estabelecida (v. comentários de lRs 16.1,2). A vara assíria pode ser ou Tiglate-Pileser III (morto em 727 a.C.) ou Salmaneser V (morto em 722 a.C.).
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