Estudo sobre Jonas 1
Jonas 1
I. CAPÍTULO 1: O Senhor
SALVA MARINHEIROS PAGÃOS DA MORTE NA TEMPESTADE
v. 1. A palavra do Senhor
veio-, sete dos Doze Profetas começam dessa forma (Oséias, Joel,
Miquéias, Sofonias, Ageu, Zacarias). Jonas, filho de Amitai-.
identifica Jonas como a personagem histórica de 2Rs 14.25 que profetizou
misericórdia para Israel (cf. v. 26), profecia que se cumpriu no reinado
de Jero-boão II (c. 793-753 a.C.). Jonas = pomba; Amitai = verdade. O uso
da terceira pessoa na narrativa significa que o próprio Jonas
não precisa ser necessariamente o autor, embora as informações,
pressupondo a historicidade, tenham vindo obrigatoriamente do
próprio Jonas. v. 2. Vá [a] Nínive: outros
profetas denunciaram nações estrangeiras de uma distância segura. Se
a proclamação fosse meramente predição, poderia ter sido feita igualmente bem a
partir da Galiléia. O fato de que Jonas tinha de ir à real situação em
Nínive e anunciar a destruição dos seus habitantes só poderia
significar que Deus desejava dar-lhes homem”. Jesus havia reivindicado
poder e glória, mas os seus inimigos propositadamente destruíram o seu
prestígio e lhe tomaram a credibilidade por meio da humilhante desgraça da
crucificação. Jesus é de fato maior do que Jonas na sua disposição de
perder prestígio e de ser mal interpretado como um impostor. E nada menos do
que o sinal do profeta Jonas, de ressurreição factual da morte,
era necessário para que se tornasse novamente um Príncipe e Salvador
digno de crédito.
Grande cidade-. Nínive estava situada à margem leste do rio Tigre,
perto da atual Mossul. As ruínas são marcadas pelas colinas chamadas Kuyunjik e
Nabi Yunus (profeta Jonas) que atualmente são habitadas e não
foram escavadas ainda apesar de ocultarem o palácio de Esar-Hadom. Nínive
foi uma das quatro cidades fundadas por Ninrode, ou Assur, depois de
deixar a Babilônia (aqui provavelmente temos uma alusão às palavras “a grande
cidade” de Gn 10.11,12). Na época do reinado de Tiglate-Pileser I
(1114-1076 a.C.), foi estabelecida como um palácio alternativo a
Assur e Calá. Senaqueribe reconstruiu e fortificou a cidade de forma intensa e
abrangente como última capital da Assíria (c. 705 a.C.). v. 3. Társis:
um lugar rico em prata, ferro, estanho e chumbo (Ez 27.12; Jr 10.9). O
termo provavelmente significa “lugar de fundição”. Os navios de
Társis eram barcos fenícios carregando metais fundidos para os portos fenícios
de Jope, Tiro etc. Társis poderia ser qualquer colônia fenícia do
Mediterrâneo Ocidental rica em depósitos de metais.
Tartesso na Espanha ou
Sardenha são possibilidades. Ir a Nínive significava 800 quilômetros para
nordeste através do deserto. Ir a Társis significava mais de 3.000 quilômetros
para o oeste (cf. “na direção oposta”, GNB). fugiu: missionários
muitas vezes têm vontade de fugir. Até Jeremias pensou em silenciar a
palavra de Deus (Jr 20.9). Elias quis desistir (1Rs 19.3,4).
Por que Jonas fugiu? Veja
as razões que Jonas dá em 4.2. Entre as sugestões, estão:
(1) Medo
de ir a uma cidade hostil e cruel.
(2) Os
rabinos sugeriram que Jonas previu que o arrependimento de Nínive refletiria de
forma adversa sobre os israelitas, que, apesar de muitas advertências
proféticas, não tinham se arrependido. Ele não estava disposto a aceitar a
misericórdia sendo concedida ao inimigo de Israel, porque uma
Nínive perdoada poderia cair sobre o indefeso Israel como o “bastão
da minha ira [da ira de Deus]” (Is 10.5). “Você precisaria ser francês, ou
russo, que três vezes e duas vezes, respectivamente, viram durante sua vida a
violência com que a Alemanha dilacerou as entranhas de seu país, para
entender completamente como um homem como Jonas deve ter pensado acerca da
Assíria. Três vezes, ao menos, a ameaça havia chegado perto, três vezes
o sopro quente da destruição havia sido sentido, três vezes a ameaça tinha
se voltado para outros” (Ellison).
(3) Ele
estava com medo da perda de prestígio, como de um falso profeta cujas palavras
não se cumpririam.
Da presença do
Senhor: cf. Gn 3.8; 4.16; Êx 33.14; 2Rs 13.23; 24.20; SL
51.11; 95.2; 139.7; Is 64.1-3. O Senhor pode nos expulsar da sua presença,
ou o homem, como Jonas, pode tentar fugir dela. Isso não precisa
significar que Jonas pensava a respeito da presença de Deus como presença cultual localizada
somente em Israel (cf. v. 9 e NBCR). A idéia de Deus ter só uma
influência local de fato existe (1Rs 20.28; 2Rs 5.17), mas Amós,
contemporâneo de Jonas, ensina a autoridade mais ampla do Senhor para
julgar as nações (Am 1.3,6,9,11,13). Jonas, o profeta de ótima reputação em
virtude de sua profecia cumprida em relação às
fronteiras restabelecidas de Israel, agora tenta abandonar o seu chamado e
renunciar à sua comissão. De forma experimental, ele está
tentando fugir do Senhor (mas v. 2.4) e fugindo especialmente do palco
dramático em que Deus está realizando os seus propósitos e juízos. Jope:
importante porto do Mediterrâneo, em que mais tarde Pedro recebeu ordem
para visitar o gentio Comélio (Atos 10.5). encontrou um navio
[...] Depois de pagar a passagem: recursos na mão e um navio
oportuno não devem ser considerados necessariamente direção
circunstancial! A interferência divina poderia ter levado Jonas a ter um
acidente, a não encontrar um leito no navio ou não ter dinheiro suficiente
para a passagem. Por que o Senhor, que obstruiu Balaão para não profetizar
contra Israel (Nm 22.22ss), permitiu que Jonas prosseguisse no caminho da
desobediência? Deus não força o homem manipulando-o como a um fantoche; antes,
ele molda a experiência de vida de Jonas para produzir nele o
consentimento da sua vontade em direção ao que Deus decidiu. Em cada
ocasião, o homem pode se recusar a seguir (Ellul, p. 24). Jonas precisava
(1) aprender a lição do poder e da onipresença de Deus;
(2) aprender que o caminho da desobediência é desconfortável,
passando pela tempestade e pelo estômago de um peixe;
(3) ser
engolido pelo “peixe”, que certamente era algo significativo não
somente para o distante futuro em relação à ressurreição de Jesus, mas era
em Sl um “sinal” possivelmente para os ninivitas e certamente para Israel.
v. 4. tempestade: a
LXX traz klydõ«, vagalhão, rebentação. Essa não era uma demonstração
despropositada do poder do Senhor sobre os elementos, nem mesmo para dobrar o
inflexível Jonas, mas para lhe dar um sentimento de preocupação pelos
marinheiros e, assim, pelos ninivitas. v. 5. marinheiros: heb. mallãhtm,
“marujos” (cf. Ez 27.9, 29). tinha desrído ao porão-, ao
compartimento de carga do navio. O heb. sephinãh provavelmente
representa a terminologia náutica fenícia, mas está relacionado ao verbo
heb. sãphan, “cobrir”.
Os israelitas, embora
vivessem não muito longe da costa, eram essencialmente um povo do interior sem
muita intimidade com o mar (a experiência marítima é mencionada somente
em Jonas, no salmo 107 e em Ez 27, que também está associado à cidade de
Tiro dos fenícios). Com o vento uivante e a terrível rebentação, não é de
admirar que o desgastado profeta tenha descido ao porão e estivesse
dormindo profundamente (sofrendo com o choque cultural!), v. 6. 0
capitão-, essa é a única ocorrência de um capitão de navio no
ATOS. Como o único profeta da Ga-liléia, podemos esperar que Jonas use algumas
palavras que poderiam ser peculiares ao dialeto do Reino do Norte. Também
devemos esperar que, visto que os judeus não eram um povo acostumado com o
mar, uma série de termos náuticos e oceanográficos tenham sido
tomados por empréstimo dos marinheiros fenícios que faziam parte da
tripulação do navio de Társis com quem Jonas teve contato, e de fato foi
isso que ocorreu. seu deus...: heb. ’elõhim, que está em
concordância com a palavra comum dos pagãos (v. Kidner).
v. 9. Eu sou hebreu:
o epíteto “hebreu” praticamente nunca ocorre no ATOS, a não ser em
narrativas do período mais antigo, e aí principalmente na boca de um
estrangeiro falando dos israelitas (Gn 39.14,17; Êx 2.6; 1Sm 4.6,9)
ou de um israelita que quer se identificar para estrangeiros (Gn 40.50; Êx 3.18;
5.3) (John Bright, History of Israel, p. 84). do Senhor, o Deus
dos céus: os fenícios adoravam “o senhor (ba‘al) do céu”, e, nas
circunstâncias em que Jonas estava, quem teria dado uma resposta mais
sensata e mais compreensível à pergunta dos marinheiros? Portanto,
a expressão não é necessariamente um título pós-exílico de data posterior
(cf. Gn 24.3,7; Dt 4.39), embora tenha sido usada em Daniel na
presença de reis que adoravam a outros deuses. Teoricamente, Jonas
acreditava no reinado onipresente de Deus, mas não experimentalmente e
psicologicamente, como ele estava descobrindo naquele momento, v. 10.
O que foi que você fez? Não é uma pergunta, mas uma exclamação de
horror. Jonas evidentemente já lhes contou antes a respeito da sua fuga, e
vamos encontrar exemplos posteriores da forma de administrar as palavras
no sentido de suprir informações necessárias que foram omitidas anteriormente.
v. Yl. joguem-me no mar.
isso era suicídio? Remorso por fazê-los sofrer? Morte substitutiva? Por que há
tanta certeza de que a tempestade vai se acalmar quando ele for jogado no
mar? A bordo do navio, Jonas viu os “estrangeiros” como pessoas. O profeta e os
seus inimigos naturais experimentaram a sua humanidade comum sobre o navio
que se contorcia e estava a ponto de se quebrar. Jonas não somente sente o
parentesco dos gentios com ele mesmo, mas a suscetibilidade e abertura
deles para o conhecimento do seu Deus (G. A. Smith). Tudo de que ele
tentou fugir e, assim, evitar, está acontecendo diante dos seus
olhos, e pela sua própria mediação ele vê os pagãos se voltando para o
temor do Senhor, v. 13. de volta à terra: os navios do mundo
antigo navegavam perto da costa, mantendo-se à vista da margem, se
esforçaram ao máximo: os homens tentam demonstrar a sua
preocupação pela vida de Jonas ao tentar evitar sacrificá-lo. O clímax é
atingido não quando Jonas sente a sua humanidade comum com os pagãos
(o Senhor está ensinando algo a Jonas) nem quando ele descobre o
temor deles pelo seu Deus, mas quando, a fim de garantir a eles a
misericórdia poupadora de Deus, ele oferece a sua própria vida
[...], portanto, Deus ainda nos força a aceitar nova luz e a realizar
tarefas estranhas (G. A. Smith). Deus “torna concreta para ele a situação
da outra pessoa. Agora isso é digno de consideração: Jonas não queria
levar a salvação a Nínive. Ele tem de levar a salvação aos homens no
navio. Quer goste quer não, Jonas não pode escapar do significado do seu
nome.
Ele é a ‘pomba’ ” (Ellul,
p. 34). v. 14,15. não nos deixes...', com uma oração nos lábios,
eles jogam Jonas no mar. Os homens pensavam que estavam sacrificando
Jonas para salvarem a Sl mesmos. Certamente uma vida foi dada no lugar de
muitas. Compare essa decisão serena de Jonas de ser o bode expiatório com
a declaração de Moisés: “risca-me do teu livro que escreveste” (Ex 32.32).
O mar se acalma de forma miraculosa (cf. Mt 8.23, 27). Jonas os
salvou humanamente e materialmente; eles não se afogarão por culpa dele. Mas
ele também os salva espiritualmente (Ellison). v. 16. adoraram o Senhor
com temor, oferecendo-lhe sacrifícios-, a repetição (no heb.) do
nome do Deus da aliança deixa claro que os sacrifícios não foram feitos ao
deus do mar, mas ao Deus de Jonas, Javé (cf. Kidner).
v. 17. um grande peixe-,
heb. dãg gãdôl, LXX kêtos (“mostro marinho”). Os hebreus não
eram um povo muito acostumado ao mar, e não podemos esperar distinções
biológicas do século XXL Até pessoas modernas às vezes descrevem mamíferos
que respiram, como por exemplo as toninhas, como sendo peixes
grandes. A ausência da palavra “baleia” é um acidente da tradução para as
línguas ocidentais, como inglês e português, e não uma questão de
inspiração bíblica. A palavra dãg (“peixe”) incluía moluscos, crustáceos
e até mesmo focas (e eventualmente também mamíferos que respiram). No
NT, o grego kêtos é traduzido na VA (também RV e RSV) por “baleia”,
mas “monstro marinho” é zoologicamente menos específico (aqui na NVI:
grande peixe). O único lugar de se encontrar um depósito renovável de
oxigênio debaixo das ondas espumantes do mar é a faringe de um
mamífero que respira (um cetáceo). Falando em termos zoológicos, um homem
engolido por um peixe iria se afogar no peixe tão rapidamente quanto na
água do mar. Parece haver poucas razões para se criarem dificuldades para
o cético, e não se resolve o debate ao fazer a concessão (como todo
cristão deve fazer) ao fato de que o Senhor poderia, se quisesse, manter
vivo de forma miraculosa um homem dentro de um peixe que extrai o
oxigênio da água, se, de fato, as palavras das Escrituras inspiradas
são igualmente aceitáveis para um mamífero marinho que extrai o oxigênio
do ar e para um peixe estritamente definido. As baleias existem em dois
grupos principais: as que se alimentam de plâncton, com um
esôfago estreito, incapaz de engolir um ser humano (Spermaceti), e as
grandes baleias dentadas (Odontoceti), que comem lulas gigantes
e grandes focas, e são capazes, portanto, de engolir (e digerir) um
homem. Ocasionalmente, são citados casos de homens que foram resgatados pouco
depois de terem caído do barco no mar, estando os homens ainda vivos
na presa da baleia. No entanto, uma investigação por meio de Lloyds do
capitão do “Estrela do Oriente” desacreditou a história de marinheiro
contada por James Bartley (Expository Times, xvii, 1905-1906, p.
521; xviii, 1906-1907, p. 239).
O milagre então é um
milagre de crono-metragem, assim que o Senhor enviou a criatura marinha para
engolir Jonas, pois, se não fosse isso, ele teria se afogado no mar. Embora o
fato da ocorrência possa ser questionado, não há razão científica para insistir
em que esse evento muito raro não possa ter acontecido. No entanto, não
podemos estar “tão obcecados por aquilo que está acontecendo dentro
da baleia e assim perdermos de vista o drama dentro de Jonas” (Gaebelein).
Por que Jonas foi engolido
pelo grande peixe?
(1) Para
salvá-lo do afogamento.
(2) Para
disciplinar o profeta.
(3) Para
proporcionar uma prefiguração da morte e ressurreição daquele que é maior
do que Jonas e que também veio da Galiléia.
(4) Como
uma parábola encenada (muito semelhante à triste experiência
matrimonial de Oséias que se tornou típica do juízo do Senhor sobre o
seu povo adúltero e também da separação dele desse povo) do fato
de Israel ser engolido pela Babilônia e depois ser vomitado
(“Nabucodonosor [...] como uma serpente nos engoliu” [heb. tanmn]
[Jr 41.34] e “[Eu] o farei
vomitar o que engoliu” [Jr 51.44]). Aceitar esse significado típico
não significa negar que o milagre de fato ocorreu. Deve-se observar, no
entanto, que a palavra para “serpente” em Jeremias é traduzida de diversas
formas por “dragão”, “monstro marinho” etc. (George Gansdale, Animais
of Biblelands, 1970, v. “Whale”, p. 137, “Dragon”, p. 252).
Qual era o estado
psicológico de Jonas? Ele estava dando a sua vida pelos marinheiros e esperava
morrer afogado. Alguns comentaristas argumentam que ele de fato morreu
afogado e foi depois ressuscitado. Jonas pode bem ter perdido a
consciência, mas sem mais evidências bíblicas a discussão continua um
tanto acadêmica.
Três dias e
três noites: cf. Mt 12.40.
Desorientado nesse tenebroso confinamento, Jonas deve ter sido incapaz de medir
o tempo. A linguagem no caso da ressurreição de Jesus mostra que isso é
uma expressão para representar um dia inteiro e porções de
dias adjacentes, i.e., não mais do que 36 horas. Observe Os 6.1,2:
“Venham, voltemos para o Senhor. Ele nos despedaçou, mas nos trará
cura [...] Depois de dois dias ele nos dará vida novamente; ao terceiro
dia nos restaurará, para que vivamos em sua presença”. Essas palavras de um
profeta contemporâneo de Jonas certamente tinham de significar alguma
coisa para os seus dias, como também precisam encontrar o seu
cumprimento maior na morte e ressurreição do Senhor Jesus.