Interpretação de Deuteronômio 16

Deuteronômio 16

16:1-17 A seção que começou em 12:1 termina com os mandamentos referentes às três peregrinações anuais ao santuário central: as festas da Páscoa e dos Pães Asmos (16:1.8), das Semanas (vs. 9.12) e dos Tabernáculos (vs. 13-15). Relativamente à legislação anterior, veja principalmente Êxodo 12; Levítico 23; Números 28 e 29. Nossos comentários aqui são principalmente devotados aos aspectos peculiares da formulação deuteronômica e os problemas relacionados. O esquema sabático volta a ser apresentado (cons. Deut. 14:28–15:18), pois todo o calendário das festas religiosas tinha um padrão sabático. Foi ainda destacada a preocupação com a maneira pela qual a projetada escolha divina de um local permanente para o santuário no meio de uma terra extensa deveria modificar a prática cerimonial anterior. Observe o uso repetido da fórmula referente ao altar central (16:2, 3, 7, 11, 15, 16).

Sendo Deuteronômio um documento de renovação de aliança, pressupondo que as estipulações anteriores ainda são válidas, com exceção das que foram expressamente modificadas, ele condensa e omite muita coisa enquanto dá uma nova ênfase aos aspectos afetados pela introdução do “lugar que o Senhor teu Deus escolher”. O reconhecimento disto deveria evitar muitas das alegações da alta crítica de que há contradição entre o Deuteronômio e a restante legislação do Pentateuco. Considerado como um tratado de suserania, Dt. 16:1-17 corresponde às exigências costumeiras de que o vassalo devia comparecer anualmente diante do suserano com o tributo estipulado. Começando com o versículo 18 surge uma nova seção, principalmente preocupada com a administração da justiça.

A Páscoa. 16:1-8. O mês de Abibe. Veja Êx. 12:1, 6; 34:18.

A páscoa. Este termo foi usado nestes versículos dando a entender a Páscoa propriamente dita e a Festa que se lhe seguia dos Pães Asmos com a duração de sete dias (cons. v. 3. observando que o antecedente de “nela” é páscoa). Consequentemente, este sacrifício da Páscoa devia ser tomado de ambos, o gado grande e o gado miúdo (v. 2), enquanto que para a Páscoa propriamente dita, indicava-se um cordeiro (Êx. 12:3 e segs.). Para os sacrifícios mencionados em Dt. 16:2, veja a narrativa da celebração em II Cr. 30:22 e segs. e 35: 7 e segs., e observe aqui o uso do termo “oferta de páscoa”, literalmente páscoas, com referência ao sacrifício de animais.

16:3 O pão de aflição fazia lembrar as circunstâncias opressivas na casa da escravidão, especialmente a oposição de Faraó à partida de Israel, o que competiu os israelitas a tomarem providências apressadas para a fuga. Sobre os versículos 3, 4a, veja coment. em Êx. 12:15, 18-20; 13:3, 6, 7; 23:15; 34:18; Lv. 23:6. Sobre o versículo 4b, veja Êx. 12:10; 23:18b; 34: 25b; Nm. 9:12. Sobre o versículo 8, veja Êx. 12:16; Lv. 23:7, 8; Nm. 28:18, 25.

16:4 A fim de indicar a Páscoa de maneira mais específica, Moisés a chama de a carne que sacrificares à tarde. As referências à “páscoa” imediatamente depois dessa designação (vs. 5, 6) também devem ser tomadas evidentemente nesse sentido restrito.

16:7a. Cozerás, e comerás (E.R.A., E.R.C.). As E.R.A. e E.R.C. criam, sem necessidade, um conflito com Êx. 12:9, traduzindo o verbo beishal por “cozer”. Só a adição específica de “com água” ou “em panelas” é que dá a este verbo hebraico o significado definido de “cozer” (cons. Êx. 12:9; II Cr. 35:13b). Quando definido mais extensamente com “no fogo”, beishal significa claramente “assar” (veja II Cr. 35: 13a). Em si mesmo ele é ambíguo. Esta ambiguidade em Dt. 16:7 deve-se ao fato que a maneira de se preparar o sacrifício para a refeição já fora estabelecida e não era a atual preocupação de Moisés. Ele estava, antes, procurando enfatizar que esta festa devia sei realizada no santuário central. Só depois da comemoração de toda a festa, preparação e participação, é que os crentes podiam se afastar do santuário para seus alojamentos.

16:7b. Às tuas tendas. A ambiguidade desta expressão (que poderia aqui se referir aos alojamentos temporários dos peregrinos na cidade santa) também se atribui ao fato de Moisés estar enfatizando a ideia do altar central. A preparação do sacrifício no santuário era uma modificação da observância da primeira Páscoa no Egito, quando o sangue foi aplicado às casas na ausência de um culto e altar centralizados.

16:9-12 Sobre o assunto desta seção, veja prescrições anteriores em Êx. 23:16; 34:22; Lv. 23:15 e segs.; Nm. 28: 26 e segs. 10a. A festa das semanas (cons. Êx. 34:22) também se chamava de “a festa da colheita” (Êx. 23:16) e “o dia das primícias” (Nm. 28:26). Mais tarde recebeu o nome grego de Pentecoste por causa da maneira como a sua data era calculada, isto é, cinquenta dias a partir de um ponto determinado (Lv. 23:16). Este ponto foi descrito aqui em termos gerais como o começo da colheita dos cereais (Deut. 16:9). Não havia necessidade de maior precisão porque a data exata já fora apresentada em Lv. 23:10 e segs. Era o segundo dia da Festa dos Pães Asmos, o dia da oferta do feixe das primícias da colheita dos cereais. Era “o dia imediato ao sábado” (Lv. 23:15), pois o primeiro dia dos Pães Asmos era um dia de descanso. Seguindo esta contagem, o Pentecoste do N.T. aconteceu em um sábado. As sete semanas entre as peregrinações da Páscoa e da Colheita davam tempo para se terminar a colheita dos cereais.

16:10b Ofertas voluntárias (cons. Nm. 29:39; Lv. 23: 38). Esta festa era cheia de alegria – alegria no Senhor, que trouxera o Seu povo ao Seu fecundo paraíso (Dt. 16:10c, 11; cons. 12:7, 12, 18; 16:14, 15) – alegria no Senhor que os livrara da escravidão (v.1 2) e assim era uma alegria que devia ser partilhada com todos os pobres dentro da família convencional (v. 116).

16:13-15 Legislação paralela está em Êx. 23:16; 34:22; Lv. 23:33 e segs.; Nm. 29:12 e segs.

16:13 A festa dos tabernáculos ou das cabanas também é chamada de “festa da colheita” (no Êxodo). Tal como a Festa dos Pães Asmos, durava uma semana, isto é, do dia quinze ao vinte e um do sétimo mês. Era seguida por um oitavo dia de descanso (Lv. 23:36,39). O nome Tabernáculos reflete o costume de habitarem em cabanas durante o festival, o que servia de lembrete da vida no deserto (cons. o uso dos pães asmos). O nome “colheita” indica que esta festa era o ponto alto do ano da agricultura, quando as uvas e os cereais já tinham sido colhidos. No ano da remissão, quando não havia colheita, esta festa era ocasião para significativas leituras públicas do texto da aliança (Dt. 31:9-13).

Novamente, o ponto principal aqui era o de reforçar a lei do santuário central – o lugar que o Senhor escolher (v.15). Aqui também, a alegria e o amor são os sinais da vida e culto convencional (v. 14).

16:16, 17 Cons. Êx. 23:17; 34: 23. Este resumo conclui com a volta de todos os olhares novamente para o santuário central (v. 16a) e coloca em destaque o caráter das peregrinações como viagens tributárias ao trono de Deus-Rei (v,16b).

16:17 Segundo a bênção que o Senhor seu Deus lhe houver concedido. Cons. I Co. 16: 2.

16:18 – 21:23 Esta seção contém uma série de estipulações relativas ao governo teocrático, com ênfase destacada sobre o poder judiciário. Israel devia acrescentar à santidade de culto, a justiça político-judicial. Entre o governamental e o relativo ao culto havia uma unidade de autoridade máxima, desde que o Senhor era ambos, Deus e Rei, em Israel. Consequentemente, todas as instituições teocráticas, diferentemente daquelas no estado comum, eram declaradamente religiosas, e havia uma extensão de prática cultual, além do santuário, dentro da administração do governo. Além disso, por causa de todas as leis teocráticas, morais e civis, como também as relativas aos cultos, estarem incluídas nas estipulações da aliança do Senhor, registradas no documento da aliança, e porque o Livro da Lei era confiado aos sacerdotes no santuário central para ser guardado e explicado por eles, o sacerdócio possuía a dominante voz judicial (cons. 21:5), pelo menos até o começo da monarquia (cons. 17:9, 10). Em aditamento ao seu conhecimento da lei escrita, os sacerdotes tinham acesso, por meio do Urim e Tumim, aos vereditos divinos diretos. Isto conferia aos sacerdotes um papel mais definitivo, mesmo embora os reis viessem a ser mais importantes no processo judicial. Por toda a terra a voz oracular do Rei divino entronizado no santuário era revelada progressivamente ao profeta e por meio dele. Mas, enquanto os profetas registravam os juízos divinos não solicitados pelos vassalos e pela liderança, o sacerdote no seu desempenho judicial relacionava-se com os litígios que surgiam entre um vassalo israelita e outro, ou com investigações legais iniciadas dentro da comunidade israelita.

16:18-20 Durante as viagens no deserto, Moisés, o mediador, foi o principal juiz de Israel, enquanto os juízes auxiliares escolhidos dentre as tribos resolviam os casos de menos importância (cons. 1:12 e segs.; Êx. 18:13 e segs.). Este arranjo fora agora modificado para atender às novas condições de vida em Canaã.

16:18. Em todas as tuas cidades. Os distritos judiciais seriam, ali, as cidades e não as divisões tribais e genealógicas. Os líderes naturais do concilio local de anciãos provavelmente seriam os juízes e os oficiais auxiliares aqui mencionados (cons. 19:12). Nesta introdução ao assunto, a ênfase recai, contudo, não na estrutura organizacional das judicaturas, mas na busca da justiça na administração da lei do Senhor – não torcerás a justiça (vs. 19, 20; cons. Êx. 23:3, 6, 8). Mesmo nos códigos e poemas épicos dos vizinhos pagãos de Israel, a virtude da justiça nos lideres era um ideal muitas vezes reiterado.

16:21–17:1 O entrelaçar-se dos processos do culto e do governo (cons. comentários introdutórios em 16:18–21:23 acima) explica o aparecimento das proscrições relativas ao culto entre os regulamentos judiciais. Estes versículos expõem de maneira concreta os princípios religiosos reguladores encontrados nas três primeiras leis do Decálogo, as quais deveriam caracterizar o procedimento judicial. Primeiro, somente a autoridade do Senhor devia ser consultada (vs. 21, 22; cons. 17:8-10). Isto se expressa negativamente na proibição do recurso idólatra das decisões oraculares (18:9-14).

16:21. Poste-ídolo (Asherá, RSV; bosque, E.R.C.), Asherá, a deusa cananita, tinha por epíteto significativo, o título “Asherá dos penhores, deusa dos oráculos” (Keret, 201, 202). Asherá e os postes-ídolos eram ao que parece, símbolos associados com o procedimento judicial, especificamente no que se relacionava com o veredito oracular (cons. Pv. 16:10). Tal papel era desempenhado pelas imagens dos deuses no Egito, especialmente no Novo Reino.

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