Mateus 3 — Comentário de Matthew Henry



Comentário do Evangelho de Mateus 3 
por Matthew Henry

Mateus 3

Versículos 1-6. João Batista - sua pregação, seu estilo de vida, e o batismo; 7-12: João reprova os fariseus e os saduceus; 13-17: O batismo de Jesus.

Vv. 1-6. Depois de Malaquias não houve profeta até João Batista. Este apareceu primeiro no deserto da Judéia. Não era um deserto desabitado, mas sim uma parte do país, não densamente povoado nem muito ilhado. Nenhum lugar é tão remoto a ponto de excluir-nos das visitas da graça divina.

João pregava a doutrina acerca do arrependimento: "Arrependei-vos". A palavra aqui usada implica completa mudança do modo de pensar: uma mudança de juízo, da disposição e dos afetos, uma inclinação diferente e melhor da alma. Considerem seus caminhos, mudem seus pensamentos; se pensaram mal, pensem de novo, e pensem bem. os verdadeiros penitentes têm pensamentos; de Deus e de Cristo, do pecado e da santidade, deste mundo e do outro, diferentes dos que tiveram anteriormente. A mudança do pensamento produz uma mudança de caminho. Este é o arrependimento do qual fala o Evangelho, o qual se produz ao ver a Cristo, ao sentir seu amor e a esperança do perdão por meio dEle. É um grande estímulo para que nós nos arrependamos; arrependei-vos porque vossos pecados serão perdoados se vos arrependerdes. Voltai-vos a Deus pelo caminho do dever, e Ele por meio de Cristo se voltará a vós pelo caminho da misericórdia.

É agora tão necessário que nos arrependamos e humilhemos para preparar o caminho do Senhor, quanto o era então. Há muito que fazer para abrir caminho a Cristo em uma alma, e nada mais necessário que o descobrimento do pecado, e a convicção de que não podemos ser salvos por nossa própria justiça. o caminho do pecado e de Satanás é um caminho retorcido, mas para se preparar um caminho para Cristo é necessário endireitar as veredas (Hb 12.13).

Aqueles que têm como atividade chamar aos demais a lamentar o pecado e a mortificá-lo, devem levar uma vida séria, de abnegação e desprezo para com o mundo. Dando aos demais este exemplo, João preparou o caminho para Cristo.

Muitos foram ao batismo de João, mas poucos mantiveram a profissão de fé feita. Pode haver muitos ouvintes interessados, mas poucos crentes verdadeiros. A curiosidade e o amor pela novidade e variedade podem levar muitos a ouvir uma boa pregação, sendo afetados momentaneamente; há muitas pessoas que nunca se submetem à sua autoridade. Aqueles que receberam a doutrina de João, testificaram seu arrependimento confessando os seus pecados. Somente os que são levados com tristeza e vergonha, a reconhecer sua culpa, estarão prontos para receber a Jesus Cristo como sua justiça. os benefícios do reino dos céus, agora já muito próximo, foram-lhes selados pelo batismo. João os purificou com água, em sinal de que Deus os limparia de todas as suas iniquidades, dando a entender com isto que, por natureza e costume, todos estavam contaminados e não podiam ser recebidos em meio ao povo de Deus, a menos que fossem lavados de seus pecados no manancial que Cristo abriria (Zc 13.1).

Vv. 7-12. Dar aos ouvintes o sentido prático é a vida da pregação, e assim foi a pregação de João. os fariseus davam ênfase principal em observâncias exteriores, descuidando dos assuntos de mais peso na lei moral, e do significado espiritual de suas cerimônias legais.

Outros eram hipócritas detestáveis, que faziam com suas pretensões de santidade um manto para sua iniquidade. os saduceus estavam no extremo oposto, negando a existência dos espíritos e do estado futuro. Eles eram os infiéis escarnecedores dessa época e nesse país.

Há uma grande ira vindoura. o grande interesse de cada um é fugir da ira. Deus, que não se deleita em nossa ruína, nos tem advertido pela palavra escrita, através dos ministros e pela consciência. Aqueles que dizem lamentar-se por seus pecados e persistem neles, não são dignos do nome de penitentes, nem de seus privilégios. Convém aos penitentes ser humildes e pequenos a seus próprios olhos, agradecer pela mínima misericórdia, ser pacientes nas grandes aflições, estar alerta contra toda a aparência do mal, abundarem todo dever, e ser caridosos ao julgar ao próximo.

Aqui há uma palavra de cautela para não se confiar nos privilégios exteriores. Existem muitos cujos corações carnais são dados a seguir o que eles mesmos dizem dentro de si, e deixam de lado o poder da Palavra de Deus, que convence do pecado e de seu poder. Há multidões que não chegam ao céu por repousarem sobre as honras e nas simples vantagens de serem membros de uma igreja. Aqui está uma palavra de terror para o negligente e confiado. Nossos corações corruptos não podem dar bons frutos, a menos que o Espírito regenerador de Cristo implante a boa Palavra de Deus neles. Contudo, toda árvore com muitos dons e honras, por mais verde que pareça em sua profissão e desempenho exterior, se não der bons frutos, dignos de arrependimento, é cortada e lançada ao fogo da ira de Deus, que é o lugar mais apropriado para as árvores estéreis. Para que mais servem? Se não dão fruto, são boas como combustível.

João mostra o propósito e a intenção da aparição de Cristo, a qual eles agora esperam com prontidão. Não há formas externas que possam limpar-nos. Nenhuma ordenança, independente de quem a administre ou a sua modalidade, é capaz de suprir a necessidade do batismo no Espírito Santo e com fogo. Somente o poder purificador do Espírito Santo pode produzir a pureza do coração, e os santos afetos que acompanham a salvação. Cristo é quem batiza com o Espírito Santo. Isto foi feito com os extraordinários dons do Espírito enviados aos apóstolos (At 2.4). Isto Ele faz com a graça e a consolação do Espírito, dados a todos que lhe pedem (Lc 11.13; Jo 7.58,39; At 11.16).

Observe-se aqui, a igreja na era de Cristo (Is 21.10). os crentes verdadeiros são o trigo, substanciosos, úteis e valiosos; os hipócritas são como palha, levianos e vazios, inúteis, sem valor, levados por qualquer vento. Estão misturados bons e maus, na mesma comunhão exterior, mas virá o dia em que a palha e o trigo serão separados. o juízo final será o dia que fará a diferença, quando os santos e os pecadores serão separados para sempre. No céu os santos serão reunidos, e não mais separados; estarão a salvo e já não mais expostos; separados da corrupção exterior e interior. o inferno é o fogo inextinguível, que certamente será a porção e o castigo dos hipócritas e incrédulos. Aqui a -vida e a morte, o bem e o mal, são postos diante de nós; como somos agora no campo, assim o seremos na árvore.

Vv. 13-17. As condescendências da graça de Cristo são tão surpreendentes, que mesmo os crentes mais firmes apenas podem acreditar nelas a princípio; tão profundas e misteriosas que mesmo os que conhecem bem a sua mente estarão prontos a oferecer objeções contra a vontade de Cristo. Aqueles que são cheios do Espírito de Deus, enquanto estão aqui, percebem que precisam pedir mais de Cristo. Não há dúvida de que João tinha necessidade de ser batizado por Ele, porém Jesus declarou que Ele deveria ser batizado por João. Cristo estava naquela ocasião em estado de humilhação. Nosso Senhor Jesus considerou conveniente, para cumprir toda justiça, apropriar-se de cada instituição divina, e mostrar sua disposição para cumprir com todos os justos preceitos de Deus.

Em Cristo e por meio dEle, os céus estão abertos para os filhos dos homens. A descida do Espírito sobre Cristo, demonstra que estava dotado sem medida com seus poderes sagrados. O fruto do Espírito Santo é amor, gozo, paz, paciência, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança.

No batismo de Jesus houve uma manifestação das três Pessoas da Santa Trindade. o Pai confirmando o Filho como Mediador; o Filho que solenemente se encarregada da obra; o Espírito Santo que desce sobre Ele para ser comunicado ao povo por seu intermédio. NEle os nossos sacrifícios espirituais são aceitáveis, porque Ele é o altar que santifica todo dom (1 Pe 2.5). Para aqueles que estão fora de Cristo, Deus é um fogo consumidor; para aqueles que estão em Cristo, um Pai reconciliado. Este é um resumo do Evangelho, o qual devemos abraçar com júbilo por fé.