Interpretação de Mateus 26

Interpretação do Evangelho de Mateus





Mateus 26

A Paixão de Jesus Cristo. 26:1 – 27:66.
Esta seção, de incalculável importância para cada cristão, está cheia de dramático interesse humano. Mas os detalhes fornecidos pelos Evangelistas têm causado problemas, principalmente cronológicos, desde os tempos mais remotos. Todavia, a maneira concreta pela qual cada Evangelho (escrito por homens que estavam eles mesmos emocionalmente envolvidos) trata esses acontecimentos altamente emocionais torna esses sublimes tratados ainda mais notáveis.

Mateus 26
A. Conspiração Contra Jesus. 26:1-16.

1-5. Última predição de sua morte.
2. Daqui a dois dias. Considerando que a Páscoa era comida ao anoitecer do dia 14 de Nisã (como o pôr-do-sol começava realmente o dia 15 de Nisã), esta predição foi feita ao anoitecer de Nisã 12.
Páscoa. A primeira grande festa do calendário judeu que comemorava a saída de Israel do Egito e a "poupança" (significado da raiz hebréia traduzida para o grego como pascha) de seus primogênitos quando Deus feriu os egípcios (conf. Êx. 12). A Páscoa era seguida logo pelos sete dias da Festa dos Pães Asmos (Nisã 15-21), e todo o festival era geralmente chamado de "Páscoa".
O Filho do homem será entregue. Conf. predições de 16:21;17:22; 20:18. Aqui Cristo prediz pela primeira vez que a sua morte ocorrerá por ocasião da Páscoa.
3-5. Essa predição, entretanto, prejudicava os planos dos conspiradores. Com medo da multidão de Jerusalém, composta de muitos galileus que apoiavam Jesus, concordaram em não fazer nada durante a festa. Talvez tenham concordado em esperar uma semana. Mas Jesus fixou o momento de sua morte com antecedência, contrariando seus planos, e orientou os acontecimentos para que pudesse morrer como a verdadeira Páscoa. Caifás ocupava a função do sumo sacerdote desde 18 A.D. mais ou menos. Anteriormente já exigira a morte de Jesus (Jo. 11:49, 50).
6-13. Ungido em Betânia. Os intérpretes não concordam sobre as ligações cronológicas deste acontecimento. À vista de Jo. 12:1, "seis dias antes da Páscoa", ou Mateus (e Marcos) ou João seguiram mais a ordem dos tópicos do que a cronológica. Considerando que nem Marcos nem Mateus datam o acontecimento com mais precisão do que "e, estando Jesus em Betânia", parece melhor seguir a inequívoca cronologia de Jo. 12:1. Assim Mateus, tendo descrito a conspiração, passa agora a um acontecimento anterior para mostrar as circunstâncias que levaram Judas a efetuar a traição. Marcos 14:3-9 e Jo. 12:1-8 são paralelos (Lc. 7:36-50 relatava um incidente diferente).
6. Simão, o leproso. Sem dúvida um leproso curado que se sentia muito grato para com Jesus.
7. Uma mulher. Maria, a irmã de Marta e Lázaro (Jo. 12:9; 11:1,2). Alabastro cheio de precioso bálsamo. Narrativas paralelas descrevem o ungüento como sendo nardo, com valor superior a 300 denários (um denário correspondia a um dia de salário de um trabalhador no campo).
8, 9. Quando os discípulos viram o generoso derramamento desse ungüento sobre o corpo (v. 12) de Jesus (cabeça, v. 7, e pés, Jo. 12: 3), indignaram-se, achando que era um desperdício. Mateus não aponta ninguém particularmente nessa murmuração (talvez envergonhado de sua participação). Mas João menciona Judas como o instigador, e mostra a hipocrisia dele em demonstrar preocupação pelos pobres.
10-13. Jesus explicou que é preciso discernimento espiritual para não desperdiçar uma oportunidade irrecuperável. Atos de benevolência sempre são oportunos (Mc. 14:7). Mas não haveria nunca mais outra oportunidade de fazer o que Maria fez. Ela o fez para meu sepultamento. Não temos autorização para sugerir que Jesus estivesse inventando desculpas para Maria. Ele já tinha anunciado sua morte iminente (Jo. 10:11, 17, 18; Mt. 16:21; 17:22; 20:18). Em vez de fechar a mente à predição, como os discípulos pareciam fazer (conf. Mt. 16:22), Maria creu nela. Parece que ela compreendeu que, por ocasião da tragédia, não haveria tempo para as cortesias costumeiras. Se encararmos o ato de Maria como nascido de sua compreensão espiritual, só então poderemos entender devidamente o tremendo elogio que partiu de Jesus. Quando isso aconteceu, foi a única unção que o seu corpo recebeu. As mulheres que vieram mais tarde para realizar essa tarefa, encontraram a sepultura vazia.
14-16. Conspiração de Judas. Não se pode determinar até que ponto o então liga o parágrafo seguinte ao precedente (Marcos diz simplesmente "e"). Se 26:6-13 deve ser considerado um parêntese, para explicar uma das raízes da traição, então a conspiração de Judas pode ter começado nos versículos 1-5. Sob esse ponto de vista, a indignação na casa de Simão seis dias antes da Páscoa (Jo. 12:1, 2) desenvolveu-se em uma conspiração amadurecida durante os próximos quatro dias. Iscariotes. Homem de Queriote, uma cidade da Judéia.
E pagaram-lhe. Mateus emprega a mesma palavra da Septuaginta em Zc. 11:12 à qual parece estar conscientemente aludindo. A Septuaginta usa histêmi ao traduzir shakal, "pesar dinheiro" (outro exemplo é I Reis 20:39 - Septuaginta, III Reis 21: 39). Assim Judas foi pago nessa ocasião, um fato que as outras narrativas não observam nem contradizem.
Trinta moedas de prata. Provavelmente siclos. Uma quantia comparativamente pequena, o preço de um escravo (Êx. 21:32).

B. A Refeição Final. 26:17-30.
Provavelmente nenhum problema de harmonia dos Evangelhos tem sido tão desconcertante quanto este. Esta refeição final foi na Páscoa dos Judeus? Os sinóticos dão a entender que foi. João, entretanto, dá a entender com muita clareza que a Páscoa ainda estava no futuro por ocasião do lava-pés (Jo. 13:1), refeição (13:29), julgamento (18:28) e crucificação (19:14, 31). Alguns mestres estão prontos a admitir um conflito irreconciliável. Outros insistem que uma das narrativas deve estar errada. Também já se argumentou que Jesus comeu uma Páscoa antecipada um dia antes do costume legal. Reforços a esta opinião recentemente vieram à luz no Qumran, onde se descobriu que a seita Qumran sempre observou a Páscoa na terça-feira. Assim, dá a impressão de que Jesus comeu a Páscoa na terça-feira (como está implícito nos sinóticos), enquanto os judeus ortodoxos observavam a Páscoa na sexta-feira. (Veja J. A. Walther, "Chronology of Passion Week", JBL, June, 1958, pág. 116 e segs.) Contra essa opinião levanta-se a grande improbabilidade que um tão notável desvio do judaísmo ortodoxo pudesse passar despercebido nos Evangelhos, ou que a ceia da Páscoa pudesse ser devidamente observada em Jerusalém antes da ocasião tradicional (por exemplo, os cordeiros tinham de ser mortos no Templo um pouco antes da ceia da Páscoa; conf. I Co. 5:7). Uma proposição mais digna de crédito explica João e os sinóticos, um à luz do outro. As duas possibilidades foram experimentadas, embora se admita dificuldades com ambos os métodos. O autor prefere explicar os sinóticos pelo explícito testemunho de João, o qual talvez tivesse parcialmente a intenção de esclarecer pontos ambíguos na cronologia. De acordo com este ponto de vista a última ceia não foi de maneira nenhuma a refeição da Páscoa; antes, Jesus morreu exatamente na hora em que os cordeiros da Páscoa estavam sendo mortos no Templo (conf. I Co. 5:7). Não obstante, Jesus deu a seus discípulos orientação no sentido de preparar a festa, por dois motivos: 1) os discípulos a comeriam; 2) Jesus não quis na ocasião predizer o momento exato de sua morte.
17-19. Preparativos para a Páscoa.
17. No primeiro dia dos pães asmos. Quatorze de Nisã, no qual o fermento era retirado de dentro das casas em preparação para as festas da Páscoa e dos Pães Asmos (conf. Mc. 14:12; Lc. 22:7). Esse dia começava ao pôr-do-sol do décimo terceiro dia e foi às primeiras horas desse dia que se fez referência.
18,19. Em resposta à pergunta dos discípulos, Jesus enviou-os a falar com um homem em cuja casa o grupo se reuniria. Celebrarei a páscoa. A esta declaração de propósito geral deve-se acrescentar as palavras de Lc. 22:16, "não a comerei", na qual ele indica posteriormente que o plano geral será interrompido. Talvez não quisesse que Judas soubesse dos seus planos tão especificamente com tanta antecedência.
20-30. A Última Ceia.
20. Chegada a tarde. Mais tarde naquela mesma tarde (primeiras horas do décimo-quarto dia), Jesus juntou-se aos discípulos na hora do jantar (Lc. 22:14).
21. Um dentre vós me trairá. Primeiro aviso de que o "entregar" do Filho do homem: (17:22; 20:18; 26:2) seria através de um dos Doze. Que choque essa declaração deve ter causado!
22. O fato de que onze discípulos tenham perguntado inocentemente, Porventura sou eu, senhor?, mostra que eles reconheciam sua própria fraqueza, embora sua pergunta fosse feita esperando uma resposta negativa – "Não sou eu, ou sou?"
23. O que mete comigo a mão. Considerando que o grupo provavelmente comia de um prato comum, esta declaração não identificou o traidor, mas apenas enfatizou a natureza vil da traição, pois ocorria entre companheiros íntimos.
24. Está escrito. A morte de Cristo estava se desenrolando conforme predito em diversas passagens do V.T. Entretanto, a soberania de Deus sobre todos os acontecimentos não livra o homem da responsabilidade ou culpa.
25. Quando Judas viu que o seu silêncio era causa de suspeitas, também perguntou, Acaso sou eu, Mestre? A ele Jesus responde, Tu o disseste. Parece que os demais não ouviram esta resposta no meio do burburinho da conversação geral. Não se pode afirmar se a explicação de Cristo a João (e Pedro) ocorreu antes ou depois da indicação de Judas (Jo. 13:23-26). Quando Judas saiu logo depois, ninguém sabia que Satanás o capacitara a imediatamente pôr em ação a conspiração (Jo. 13:27-30).
26. A narrativa que Mateus faz da consagração do pão e do vinho é semelhante à de Marcos; à de Lucas parece com I Co. 11:23-26. Isto é o meu corpo. Para um comentário completo dos pontos de vista contrários do Romanismo, Lutero, Calvino e Zuínglio, consulte dicionários bíblicos. O significado óbvio da passagem não permite que entendamos que o pão fosse mais do que simbólico sob qualquer aspecto, pois seu corpo real também estava presente. (Conf. metáforas semelhantes: Jo. 10:7; 15:1). Estes símbolos deviam ser lembretes para os discípulos (Lc. 22:19) do Senhor ausente, e um memorial do custo de sua redenção.
27, 28. Bebei dele todos, isto é, todos vocês.
O Novo Testamento ou aliança foi posto em vigor com a morte de Cristo. A velha aliança dada por Deus a Israel exigia sacrifícios contínuos pelo pecado. Mas a morte de Cristo forneceu um sacrifício perfeito, e tornou possível ambas, a justificação e a regeneração (Hb. 8:6-13). Derramado em favor de muitos. (Conf. 20:28) A morte de Cristo, embora suficiente em si mesma para resolver a questão da remissão dos pecados de todos, aqui foi considerada realmente eficiente só para os crentes.
29. Desta hora em diante, não beberei. Esta declaração dirigiu o olhar dos discípulos para o futuro reino do Pai (o reino de Deus, messiânico, Mc. 14:25) e para o momento de alegria e comunhão na grande Ceia das Bodas.
30. Tendo cantado um hino, saíram. Antes disso deve ter sido apresentado o discurso de João 14.

C. A Predição da Negação de Pedro. 26:31-35.
Isto aconteceu antes que deixassem o cenáculo (Jo. 13:36-38; Lc. 22:31-34) ou depois (Mc. 14:27-31; Mt)? Considerando que parece impossível harmonizar estas narrativas sem violentar duas delas, é mais exeqüível entender duas advertências distintas feitas a Pedro.
31. Todos vos escandalizareis. Embora só Pedro tenha negado Jesus, todos os onze o abandonaram e fugiram (v. 56). Jesus encarou o fato como cumprimento de Zc. 13:7.
32. Irei adiante de vós para a Galiléia. Era a grande reunião pós-ressurreição mencionada diversas vezes (28:7, 10, 16). Ela não impossibilita outras aparições, algumas delas anteriormente na Judéia.
33-35. A presunção de Pedro em colocar a sua devoção acima da dos outros (ainda que venhas a ser tropeço para todos) foi uma censura para eles e fê-los também dar os seus votos de lealdade. Essa experiência estava sem dúvida na mente de Jesus quando ele perguntou a Pedro mais tarde, "Amas-me mais do que estes?" (Jo. 21:15).

D. Acontecimentos no Getsêmani. 26:36-56.
36-46. A oração.
36. Getsêmani. O nome significa "prensa de azeite", e descreve aqui um jardim freqüentado por Jesus e os discípulos. Ficava do outro lado do Cedrom, no Monte das Oliveiras (Lc. 22:39; Jo. 18:1, 2), e sem dúvida continha oliveiras e uma prensa para a extração do seu azeite. O lugar que hoje em dia se mostra aos visitantes deve ficar perto daquele lugar, embora as velhas árvores não possam ser as originais (Jos. Wars, vi. 1.1 .).
37, 38. Deixando oito discípulos reunidos, Jesus levou Pedro, Tiago e João mais adiante e entraram no jardim. Finalmente ele se afastou até mesmo deles para ficar sozinho em oração. A agonia da alma que ele experimentou foi descrita como profundamente triste até a morte. Ordenou aos três que se encontravam mais perto (como também aos demais de um modo geral) que velassem, isto é, que lhe emprestassem força através de sua presença alerta e simpática.
39. Se possível, isto é, moralmente possível, consistente com a vontade do Pai.
Passe de mim este cálice. A chave para se compreender a agonia de Cristo está em se identificar o cálice. Embora qualquer ser humano normal trema diante dos horrores da crucificação, os mártires muitas vezes têm enfrentado a morte cruel sem tal desespero extremo (conf. Lc. 22:44). Não podemos também aceitar a opinião de que Cristo temesse a morte prematura nas mãos de Satanás, pois o cálice vinha do Pai, não de Satanás (Jo. 18:11). Além disso, a vida de Cristo só podia ser entregue voluntariamente (Jo. 10:17,18). Cálice foi usado figuradamente nas Escrituras em se referindo à bênção de Deus (conf. Sl. 23:5), ou à sua ira (conf. Sl. 75:8). Portanto, a explicação mais satisfatória do cálice é que se relaciona com a ira divina em que Cristo incorreria na cruz ao tomar sobre si o pecado do homem.
Essa experiência na qual Deus ficaria por algum tempo separado do seu Filho, deu lugar ao horrível grito de Mt. 27:46. Se o pecado de um só homem pode fazê-lo sentir amarga tristeza quando experimenta a separação de Deus, quão incomparável deve ter sido a angústia de Jesus, que sabia o que significava assumir a culpa de todos os homens.
Não seja como eu quero e sim, como tu queres. Desde o começo até o fim, a oração de Cristo foi perfeitamente submissa ao Pai. E a oração foi atendida, não removendo o cálice, mas concedendo forças para bebê-lo (Lc. 22:43), e finalmente a ressurreição "da morte" (Hb. 5:7).
40, 41. Encontrando os discípulos dormindo em conseqüência do efeito extenuante da fadiga e da emoção prolongada, Jesus escolheu Pedro para uma entrevista particular (talvez à vista de sua recente jactância), insistindo com ele a continuar alerta e orando para que os acontecimentos não viessem surpreender entregando-se a tentação. O espírito, na verdade, está pronto. A natureza espiritual do homem iluminada pelo Espírito Santo. Mas a carne é fraca. Alguns pensam que a carne aqui indica uma parte da constituição do ser humano que não é pecadora se controlada pelo espírito (e assim o provérbio poderia se aplicar também a Jesus); outros, que indica a natureza pecadora que todos os homens possuem (exceto Jesus).
42-45. Substancialmente, esta oração foi proferida três vezes; em todas elas a submissão do Filho foi completa. Mas é claro que Jesus sabia qual seria o resultado. Ainda dormis. Provavelmente não era ironia, mas uma simples declaração de que a sua oportunidade de serem úteis em uma crise já tinha passado.
46. Neste momento, entretanto, Jesus percebeu que o inimigo se aproximava. Levantai-vos. Não para fugir, mas para ir ao encontro dele (Jo. 18:4).
47-56. A prisão.
47. Grande turba. Um destacamento de soldados romanos, com suas costumeiras espadas, sob as ordens de um quiliarca (Jo. 18:12); a polícia do templo judeu sob as ordens dos principais sacerdotes e dos anciãos, armada de varapaus (Jo. 18:12); alguns dos príncipes dos sacerdotes e os anciãos (Lc. 22:52).
48. Havia dado um sinal. A maior parte dos soldados romanos não conhecia Jesus.
49. E o beijou. A forma composta aqui (katephilêsen) sugere um abraço forte e caloroso (em contraste com a forma simples mencionada no versículo 48).
50. Amigo. Camarada, companheiro (hetaire). O termo reconhece sua associação anterior, sem a conotação de afeição.
Para que vieste? Essas palavras de Jesus seriam elípticas, às quais deveríamos acrescentar algum verbo, como por exemplo, "Faça aquilo a que vieste"? Ou uma pergunta, "Por que vieste?" Ou uma triste exclamação, "Por que motivo vieste!" Seja qual for a precisa intenção, Judas e os soldados continuaram executando o seu plano.
51. Um dos que estavam. Identificado por João como sendo Pedro. Sacou da espada. Os discípulos tinham duas dessas curtas espadas (Lc. 22: 38).
Golpeando o servo. João, conhecendo bem a família do sumo sacerdote, registra o nome do servo, Malco (Jo. 18:10, 15).
A orelha. Conf. Lc. 22:51. A atitude impetuosa de Pedro, ainda que bem-intencionada, comprometia seriamente a posição de nosso Senhor, e tornou necessário uma cura milagrosa para desfazer os desastrosos efeitos que provocaria no tribunal (conf. Jo. 18:36). E tão completo foi o milagre que o caso da mutilação nunca foi levantado pelos acusadores de Cristo.
52. Todos os que lançam mão da espada, à espada, perecerão. Cristo e sua mensagem não deveriam ser defendidos nem proclamados com armas carnais. Este princípio geral declarado por Jesus tem sido confirmado na experiência humana. "A espada é visitada pela espada na guerra; a espada da retribuição se opõe à espada arbitrária da sedição rebelde; e a espada levantada sem espiritualidade em uma causa espiritual, é vingada na certa pela espada da vingança histórica", embora talvez bastante atrasada (J. P. Longe, Matthew, pág. 486 ).
53, 54. Doze legiões de anjos. Cada legião romana completa era composta de 6.000 homens. Cristo absteve-se de invocar as forças incomparavelmente superiores que estavam às suas ordens, para que as Escrituras que prediziam seu sofrimento pudessem ser cumpridas.
55, 56. Como a um salteador. A presença de armas sugere que eles esperavam uma defesa violenta, como a de um valente salteador (não a fuga apressada de um "ladrão"). Mas toda a experiência passada com Jesus deveria ter desfeito essa noção. Será que (conforme Plummer e outros sugerem) essa espantosa reação de Jesus em atribuir esses acontecimentos ao cumprimento de profecias demarcou o ponto no qual Judas afastou-se da demoníaca conspiração e acabou no remorso que o levou ao suicídio?

E. Acontecimentos nos Tribunais Judeus. 26:57 - 27:2.
Primeiro Jesus foi conduzido à presença de Anás, o ex-sumo sacerdote, que ainda tinha muito prestígio (Jo. 18:12-23). Depois do interrogatório preliminar, que deu tempo para o Sinédrio se reunir para essa sessão noturna altamente irregular, Jesus foi levado à presença do Sinédrio. De madrugada, uma segunda sessão do Sinédrio formalmente convocada condenou-o (Mt. 27:1).
57-68. Primeira sessão do Sinédrio.
57. Sumo sacerdote Caifás. Genro do deposto Anás. Parece provável que Caifás e Anás morassem no mesmo edifício, talvez separados por um pátio. A esta altura dos acontecimentos, os escribas, os anciãos e os principais sacerdotes estavam reunidos para essa sessão extraordinária.
58. E Pedro o seguia, conseguindo entrar no pátio (não no palácio) com a ajuda de João (Jo. 18:15, 16).
59. Procuravam algum testemunho falso. Aqueles judeus sabiam que não tinham um processo legal contra Jesus; por isso tinham de usar acusações forjadas.
60, 61. As acusações, entretanto, eram tão vagas e inconsistentes que não puderam encontrar nem mesmo duas testemunhas – o mínimo especificado por lei (Dt. 17:6) – que concordassem entre si. Finalmente arranjaram duas que deturparam uma declaração de Jesus pronunciada três anos antes (Jo. 2:19).
Eu posso destruir este santuário de Deus. A declaração propriamente dita atribuía a destruição aos judeus; e a referência foi ao seu corpo, não ao edifício herodiano (Jo. 2:21). Talvez algumas das declarações de Jesus no discurso do Monte das Oliveiras (24:2) foram grosseiramente deturpadas por Judas e combinadas com esta declaração (Jo. 2:19).
62. Não respondes ao que estes depõem contra ti? Caifás esperava forçar o prisioneiro a fazer alguma declaração imprudente. Mas as ferozes acusações proferidas com veemência contra Jesus foram muito bem respondidas com o seu digno silêncio (conf. Is. 53:7).
63. Eu te conjuro. Uma fórmula que informava Jesus de que a sua resposta seria considerada sob juramento. O Cristo, o Filho de Deus. Embora alguns disputem a importância plena de Filho de Deus, parece claro que Caifás empregou a expressão no seu único sentido da deidade, uma vez que a confirmação provocou a acusação de blasfêmia. Essa foi a causa real da condenação de Cristo (Jo. 19:7), e fora a base de anteriores conspirações contra ele (Jo. 5:18). Notícias de outros incidentes que sustentavam essa reivindicação devem certamente ter alcançado os ouvidos do sumo sacerdote (Jo. 1:34, 49; 9:35-37; 11:27; Mt. 14:33; 8:29, e outras.)
64. Tu o disseste. Uma confissão inequívoca de que ele era o Messias divino (a declaração de Jesus sob juramento não invalida o ensinamento de 5:34, onde ele dá leis aos seus discípulos. Nessa posição única de Filho de Deus, os fatores que tornariam o juramento objetável diante dos homens não são relevantes diante dele.)
O Filho do homem assentado à direita do Todo-poderoso, e vindo sobre as nuvens do céu (conf. Dn. 7:13, 14; Sl. 110:1). Um pronunciamento sobre as posições de Jesus e seus juizes que finalmente seria invertida.
65, 66. Rasgou as suas vestes. Uma indicação de horror justificado, sem dúvida sincero (embora errado). A tradição judia especificava com alguns detalhes como esse ato tinha de ser praticado. Blasfemou. Acusação do mais grave ultraje religioso. Tendo Jesus abertamente confessado aquilo de que há muito o acusavam (Jo. 5:18) e tendo aplicado Dn. 7:13, 14 a si mesmo, foi declarado réu de morte (isto é, merecedor da morte), provavelmente por aclamação nesse julgamento noturno, e não por votação secreta formal.
67, 68. A violência física aplicada a Jesus pelos seus capturadores (provavelmente oficiais inferiores, Lc. 22:63), incluiu cuspir em sua face, esmurrá-lo, bater nele com varas ou mãos (isto é, esbofeteá-lo) e vendar-lhe os olhos (Lc. 22:64) a fim de zombar do seu ofício de profeta.
69-75. A negação de Pedro. As três negativas ocorreram através dos estágios dos julgamentos judeus e são diversamente agrupados pelos evangelistas. As diferenças entre as narrativas defendem fortemente a independência essencial, e os detalhes admitem várias maneiras de harmonizá-los (Veja quadros em Alford, NT for English Readers, pág, 199; S. J. Andrews, Life of Our Lord, pág. 518.)
69. O pátio. Aproximando-se uma criada. Identificada por João como a porteira que deixou Pedro entrar (Jo. 18:16, 17).
71, 72. Para o alpendre. Provavelmente o vestíbulo ou passagem que dava para a rua.
Outra criada. "A criada" de Marcos dá a entender que é a mesma anteriormente mencionada (embora ele talvez se refira simplesmente à criada que estava no vestíbulo); Lucas diz que o interrogante era um homem. Assim parece que a segunda negativa foi induzida pelo interrogatório de diversos indivíduos. Com juramento. Esquecendo-se das advertências de Jesus contra tais juramentos para se estabelecer a sinceridade de uma pessoa (5:34).
73. Logo depois. Cerca de uma hora (Lc. 22:59). Os que ali estavam. Particularmente, um parente de Malco (Jo. 18:26). O teu modo de falar o denuncia. Acento e pronúncia da Galiléia.
74. Começou ele a praguejar. Rogando pragas a si mesmo, caso estivesse mentindo. E a jurar. Invocando os céus como testemunha às suas palavras (conf. 5:34--37). Cantou o galo. A segunda vez nessa noite (Mc. 14:72).
75. Pedro se lembrou (conf. Mt. 26:34). Embora a dependência da carne causasse a lembrança das advertências de Cristo, o simples cantar de um galo despertou Pedro para a enormidade do seu pecado de zombar da graciosa tentativa de Jesus de impedi-lo.
Chorou amargamente. Contraste com Judas, cheio de remorsos mas sem arrependimento (27:5).

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