Estudo de Gênesis 6
Estudo de Gênesis 6
6:1—8:22 O diluvio
6:1-7,11-13 A causa do diluvio
A genealogia do capitulo 5 deixa claro que,
além dos descendentes de Adão e Eva citados por nome, cada um desses homens
“teve filhos e filhas”. Caim também teve filhos e filhas que, por sua vez,
tiveram suas próprias famílias. Assim, no tempo de Noé, a decima geração depois
de Adão, a população havia crescido consideravelmente, como indica o inicio do
capítulo 6: como se foram multiplicando os homens na terra (6:1).
O ideal de Deus para a família já havia
sofrido dois golpes, pois o relacionamento entre marido e mulher não era mais
inteiramente aberto, como se percebe na necessidade de esconderem um do outro
algumas partes do corpo (3:7), nem monogamo (4:19). Aqui, essa relação sofreu
um terceiro golpe que a distorceu ainda mais, pois os filhos de Deus se
casaram com as filhas dos homens (6:2). Num casamento desse tipo,
o marido e a mulher não estão mais vivendo no temor do Senhor. Entraram numa
aliança entre a luz e as trevas, entre o sagrado e o profano (2Co 6:14). Deus
havia advertido que a consequência do pecado era a morte (2:17) e, diante dessa
perversidade crescente, ele determina que essa morte ocorrera ainda mais cedo,
reduzindo o limite da vida humana a cento e vinte anos (6:3). No
entanto, e possível que essa determinação tenha sido um ato de misericórdia, pois
e difícil viver anos a fio sem a paz de Deus no coração.
Fica claro que esses casamentos mistos
desagradaram ao Senhor. No entanto, não há um consenso entre os estudiosos quanto
a identidade das partes envolvidas. Alguns argumentam que os “filhos de Deus”
eram anjos caídos, possivelmente os mesmos que, segundo Judas, “abandonaram o
seu próprio domicilio”, ou seja, seu estado (Jd 6). Nesse caso, as mulheres foram
consideradas tão perversas que se dispõem a casar com qualquer um, ate mesmo
com um anjo caído. Os anjos tomaram para si [...] as que mais
lhe agradaram. Aqueles que defendem esse ponto de vista argumentam que
os gigantes (cf. Nm 13:33) de 6:4 nasceram dessas uniões mistas.
No entanto, a linguagem usada não parece exigir essa interpretação, pois o
texto parece dizer apenas que os gigantes existiam no tempo em que estavam ocorrendo
essas uniões mistas. A referência a eles pode ser simplesmente uma indicação de
que, além de abençoar a humanidade com uma vida longa e crescimento numérico, Deus
também havia lhes concedido uma grande estatura.
Uma possibilidade mais provável e que o
texto esteja se referindo a casamentos mistos entre homens da linhagem de Sete
(chamados de “filhos de Deus” pelo fato de Sete, seu antepassado, ser temente a
Deus) e mulheres da linhagem de Caim (chamadas de “filhas dos homens” pelo fato
de Caim ter sido expulso da presença do Senhor e seguido sua própria vontade,
como fizeram descendentes como Lameque). Nesse caso, a linhagem de Sete, que
devia promover a vontade de Deus, havia perdido o foco a tal ponto que tudo o
que importava era a beleza das mulheres da linhagem de Caim. Embora apresente
algumas imperfeições, essa hipótese tem o mérito de enfatizar a diferença entre
as linhagens de Caim e Sete: ao que parece, a tradição de Enos de invocar o
nome do Senhor (4:26) começa a desaparecer. Deus se desagrada quando todos se
tomam perversos e não e mais possível fazer distinção entre as pessoas com base
em seus valores.
As palavras era continuamente mau todo o
desígnio do seu coração (6:5) mostram os crescentes avanços do mal
entre os seres humanos. O autor também diz que a humanidade estava
corrompida e cheia de violência (6:11-12). Infelizmente, essas
palavras se aplicam muito bem as nossas sociedades do século XXI. Assim,
devemos atentar para a atitude do Senhor diante dessas condições: resolvi
dar cabo de toda carne [...] eis que os farei perecer juntamente
com a terra (6:13). Deus não fez isso com alegria ou ira insensível.
Pelo contrário, este e um dos versículos mais comoventes das Escrituras,
pois nos diz que Deus tomou essa atitude com tristeza: e isso lhe
pesou no coração (6:6). Os filhos que causam esse tipo de dissabor ao
pai são amaldiçoados, quer a maldição seja pronunciada, quer não. O Deus
entristecido aborrece o mal e age de modo a tratar dele. E por isso que nos,
africanos, não podemos considerar nossa situação levianamente.
Será que o coração de Deus está
entristecido e pesado por causa de nossa corrupção e perversidade? Nesse caso,
estamos sob a maldição do Deus que concede e sustenta a vida! Isso não
significa que e impossível escapar dessa maldição. Deus e um Pai amoroso que
deu seu Filho Jesus Cristo para nos resgatar (G1 3:13). No entanto, também e um
Deus de justiça e retidão (Mq 6:8), e é nossa responsabilidade corrigir aquilo
que está errado. Como qualquer outro lugar do mundo, na África não faltam erros
aguardando correção.
O restante da criação não participou do
pecado humano, mas, ainda assim, foi contaminado pelo contato com os seres
humanos e destruído junto com eles (6:7). O pecado e como o fermento que
permeia todo o pão. O homem que, em tempos idos, era a coroa da criação com sua
beleza e vida em comunidade (1:31), arruinou tudo o que Deus havia criado. De
acordo com o principio aplicado a esse caso, o comportamento do chefe da
família afeta não apenas ele próprio, mas toda a sua casa. Vimos a aplicação
desse principio em relação a pais e filhos (Caim e Lameque — 3:19-24), e vemos
como continua valido tanto para chefes de estados e instituições como para a
relação entre os seres humanos e a natureza.
6:8-10,14-18 Uma exceção
Apesar de o mundo ter se afundado em
pecado, houve alguém que achou graça diante do Senhor (6:8). Esse
individuo e descrito como um homem justo e integro entre os seus contemporâneos,
um homem que andava com Deus (6:9). Muitos cristãos africanos se
perguntam se é possível prosperar sendo honesto nos negócios, se podemos nadar
contra a mare e, ainda assim, ser bem-sucedidos. Noé nos dá a resposta. Ele
encontrou favor diante de Deus. O mesmo acontecera com qualquer um que
glorificar a Deus em sua geração, por mais que o mal tenha se tomado parte de
nossa sociedade.
Deus revelou seus planos a esse homem extraordinário
(6:13) e lhe deu instruções especificas. A princípio, Noé recebeu uma ordem
geral, Faze uma arca (6:14a), e só depois recebeu os detalhes sobre
a construção (6:15-16). Noé precisava, primeiro, decidir obedecer a instrução
geral de Deus; só então os detalhes seriam relevantes. Deus opera da mesma
forma hoje ao nos dar a instrução geral “Crê no Senhor Jesus” (At 16:31; Jo 3:16,36),
que deve ser obedecida antes de qualquer fato específico. E inútil discutir questões
acadêmico-teológicas sobre Jesus antes de obedecer a instrução inicial de crer
nele. De nada serve, no plano divino da redenção, o conhecimento de minúcias bíblicas
ou teológicas sem disposição para a obediência.
A arca seria construída de tabuas de
cipreste, teria compartimentos e seria revestida por dentro e por
fora com betume para impermeabilização (6:146). Teria trezentos
côvados (140 m) de comprimento, cinquenta côvados (23 m) de largura
e trinta côvados (13,5 m) de altura (6:15). A arca
teria uma porta na lateral e seria coberta, mas Noé deveria
deixar uma abertura de um côvado de altura entre as
paredes e a cobertura para permitir a circulação do ar (6:16).
Por dentro, a embarcação teria três pavimentos. As instruções de Deus
foram especificas porque só ele estava a par de detalhes como a
intensidade e a duração do dilúvio, quem seriam os ocupantes da arca e
assim por diante. E fato comprovado que uma arca com essas medidas
poderia boiar.
Em 6:13, o Senhor revelou a Noé que
destruiria toda a humanidade e em 6:17 explicou de que maneira isso
ocorreria. Essa explicação deve ter ajudado Noé a entender por que era necessário
construir a arca. A declaração do Senhor tudo o que ha na terra perecera deve
ter sido profundamente perturbadora, mas, assim como Noé não a questionou, não nos
cabe questiona-la. Como Criador, Deus tem o direito de destruir sua criação. No
entanto, também há esperança, pois Deus prometeu a Noé: Contigo, porem,
estabelecerei a minha aliança; entraras na arca, tu e teus filhos, e tua
mulher, e as mulheres de teus filhos (6:18). Deus não se compraz na
destruição injustificada.
Ele destruiu a terra porque ela não estava
mais cumprindo o proposito para o qual ele a havia criado. O proposito da humanidade
e da criação era declarar o “eterno poder [de Deus], como também a sua própria
divindade” (Rm 1:20), e sua santidade (SI 19:1; 29:2; Is 43:7; 51:7). Quando os
seres humanos frustram essa intenção em vez de promovê-la, o Criador — como os inventores
de nosso tempo — tem todo o direito moral de começar da estaca zero. Aqueles que
preservam a justiça de Deus, como fez Noé, encontram segurança. O Senhor firma
uma aliança com aqueles que procedem desse modo, mas destrói o restante. Assim,
ao pregarmos, jamais devemos enfatizar a graça
de Deus a custa de sua justiça. E preciso manter o equilíbrio entre seu amor e
sua santidade, pois ele preserva ambos.
Junto com Noé foram salvos sua esposa, os
três filhos e respectivas esposas (6:18; 7:13). Podemos argumentar que eles
foram salvos porque as bençãos de Noé se estenderam a toda a sua casa. Também e
possível que o relacionamento de Noé com Deus tenha influenciado seus
familiares a ponto de qualificar todos os membros de sua casa para entrar na
arca. Considerando-se o contexto geral da passagem, a primeira explicação parece
mais provável. Esse princípio de comunidade sem duvida e aplicado em situações
semelhantes, como quando Ló recebeu a ordem de reunir seus familiares e sair de
Sodoma (19:12). Mais uma vez, somos lembrados da importância do relacionamento
entre o chefe da família e Deus, pois a conduta desse homem ou mulher pode
resultar num transbordamento de bençãos ou
maldições para o restante da família.
6:19— 7:5 O objetivo do
diluvio
Apesar da destruição de tudo o que não estava
na arca (7:21-23), o objetivo maior do dilúvio não era eliminar toda a vida,
mas sim acabar com o baluarte do pecado. Pode-se dizer que o dilúvio não visava
aniquilar a criação, mas preservá-la por intermédio de tudo o que Deus havia
ordenado a Noé colocar na arca para permanecer seguro. A destruição de toda a
criação teria representado um fracasso do Criador, mas o Senhor não falha em
nenhum de seus propósitos.
Nem mesmo o pecado inicial de Adão e Eva
frustrou seus planos, pois ele anunciou na mesma ocasião a vinda futura do
Salvador que esmagaria o diabo e daria inicio a uma nova comunidade que celebraria
a gloria de Deus (3:15). Assim, ao anunciar que destruiria “toda carne em que ha
folego de vida” (6:17), Deus não estava fazendo uma declaração literal. Além de
não destruir Noé e sua família, ele também poupou representantes de todas as espécies
de animais para que a vida pudesse ter continuidade. Ele havia descansado da
obra da criação (2:2), e nem mesmo a destruição do mundo o faria retoma-la.
Assim, Deus instruiu Noé a colocar dentro da arca um macho e uma fêmea de cada
espécie de ave e animal (6:19-20a), provendo com isso tanto o extermínio
quanto a continuidade. Uma geração e eliminada, mas um remanescente sobrevive
para iniciar uma nova geração.