Qual a Fonte da Teologia de Paulo?

Qual a Fonte da Teologia de Paulo?
Uma outra questão importante é sabermos quais as fontes do pensamento de Paulo. Ou seja, de onde ele tirou as idéias que aparecem exclusivamente em seus escritos, como a comparação de Jesus com Adão, o conceito da transformação dos corpos dos crentes vivos por ocasião da parousia (vinda do Senhor) ou ainda as exortações e recomendações éticas, práticas e morais que ele passa aos cristãos.

Paulo era um homem de três mundos. Foi educado, como judeu, na religião e cultura hebraica, à qual pertencia por nascimento e tradição; viveu no mundo grego, cuja cultura, religiões e maneira de encarar o mundo eram dominantes em seu tempo; e pertencia ao mundo romano, como cidadão do mesmo. A multiculturalidade de Paulo levanta uma das mais complexas questões relacionadas com os estudos paulinos: qual destas culturas exerceu maior influência em seu pensamento? Que cosmovisão moldou sua teologia? E que filosofia e religião acabaram por formar seu pensamento? Ou será que foi um pouco de cada? A questão da origem do pensamento religioso de Paulo tem exercitado os seus estudiosos por séculos.

A importância disto é muito grande para entendermos Paulo. Suponhamos que Paulo, apesar de judeu, era basicamente um grego, em sua maneira de pensar e de ver o mundo. Logo, quando formos estudar sua pregação, deveremos procurar paralelos no mundo grego, em sua literatura, filosofia e religião. Aliás, esta é uma idéia defendida por muitos estudiosos de Paulo, que ele era um judeu da Dispersão, e portanto, muito influenciado pela cultura helênica, pelas religiões gregas, pelo dualismo grego entre o mal e o bem e pelas idéias do neoplatonismo de sua época. Alguns, como os antigos estudiosos da escola alemã de Tübingen, chegaram a pensar que Paulo era um grande gnóstico, e que suas idéias como união com Cristo, a presença de Cristo na Ceia e mesmo o próprio conceito de que Cristo encarnou, morreu e ressuscitou para salvar pecadores foram tomadas de empréstimo por Paulo de antigas religiões pagãs de mistério. Assim, quando eles estudavam Paulo, procuravam paralelos no gnosticismo, nas religiões gregas e nas lendas e mistérios de religiões dualistas.

DOIS TIPOS DE JUDAÍSMO?

Os judeus na época de Paulo se concentravam em dois lugares: na Palestina e na Dispersão, nome dado ao Israel espalhado pelas cidades gregas e romanas do Império. As maiores colônias judaicas estavam em Alexandria, em Roma e na Mesopotâmia. Os judeus da Dispersão praticavam um Judaísmo mais ameno, por causa da distância do templo, o contato constante com os gentios e a força influenciadora do helenismo. Entretanto, mantinham-se leais às principais instituições judaicas, como o sábado, a circuncisão e as leis sobre alimentação. Paulo era um judeu da Dispersão, foi aparentemente criado em Tarso e sua educação rabínica se deu em Jerusalém (Atos 22.3). Muito embora o Judaísmo da Palestina fosse mais rigoroso por causa da presença do templo, dos fariseus e escribas, não devemos postular uma diferença muito grande entre estes dois tipos de Judaísmo.

Porém, para um grupo crescente e mais influente de estudiosos, o background de Paulo era o Judaísmo, especialmente o tipo de Judaísmo existente na Dispersão, fora de Jerusalém, nas cidades gregas onde havia colônias judaicas e suas sinagogas. Paulo havia nascido em Tarso, filho de fariseu. Recebeu a educação padrão dos judeus nas Escrituras Sagradas. Muito embora também tivesse recebido uma educação no helenismo, predominou nele sua educação judaica. Assim, devemos buscar nas Escrituras dos judeus – o Antigo Testamento – as fontes do pensamento de Paulo. Certamente comparações e paralelos com o mundo helenista poderão nos ajudar, já que Paulo era cidadão de dois mundos. Mas é
no Judaísmo do primeiro século que encontramos a matriz do seu pensamento.

Além disto, devemos mencionar mais duas outras influências decisivas na pregação do apóstolo. Primeira, os ensinos de Jesus. Muito embora Paulo não tenha conhecido a Jesus Cristo pessoalmente, certamente recebeu os ensinamentos dele dos que já eram cristãos anteriormente, como por exemplo, sobre a Ceia (1 Co 11.23). Segunda, o ensino da Igreja apostólica. Quando Paulo se converteu a Cristo, a Igreja já estava em existência. Através dos muitos contatos que teve com os cristãos, em Jerusalém e em Antioquia, Paulo tomou conhecimento e absorveu o ensinamento da Igreja. Por exemplo, ele diz que "recebeu" os pontos fundamentais da fé, como a morte de Cristo por nossos pecados e a sua ressurreição (1 Co 15.3-4). A expressão "recebeu" indica transmissão por via oral de uma tradição reconhecida. Paulo provavelmente "recebeu" da Igreja primitiva a tradição oral, originada com o próprio Jesus, quanto à sua morte e ressurreição.

Isto significa que ao estudarmos o pensamento de Paulo, devemos buscar entendê-lo à luz das Escrituras do Antigo Testamento, do ensino do Senhor Jesus e da mensagem da Igreja apostólica, que se encontra refletida nos demais escritos do Novo Testamento. Há temas na pregação de Paulo que não encontramos explicitamente nestas fontes. A originalidade deve ser creditada à contribuição pessoal de Paulo, que sob a orientação do Espírito de Deus, revelou-nos ainda mais profundamente o mistério de Deus, Cristo (Ef 3.4).