Livro de Zacarias

Livro de Zacarias
O Livro de Zacarias é o décimo primeiro livro dos profetas menores. Livro que contém as mensagens de Zacarias, um dos profetas que voltaram do cativeiro. Nos caps. 1—8 há uma série de visões referentes à reconstrução de Jerusalém e do Templo. Zacarias fala também do perdão de Deus e da vinda do Messias. Os caps. 9—14 falam a respeito do Messias e do juízo final.


Autor e Data

O livro preserva as visões e declarações do profeta Zacarias (31), filho de Berequias e neto (ou “descendente”) de Ido, e talvez relacionado a uma casa sacerdotal. Um contemporâneo pós-exílico de Ageu (520–518 a.C.), o ministério de Zacarias concentra-se principalmente no sofrimento dos exilados recém-retornados e na necessidade de reconstruir o templo em Jerusalém.

O Profeta

O nome Zacarias não era incomum em Israel. Significa “Jeová se lembra” ou “Jeová se lembrou” (i.e., de responder as orações dos pais por um filho). O título do livro diz que este profeta é “filho de Berequias” e neto “de Ido” (1.1). Esdras, por outro lado, menciona que é “filho de Ido” (Ed 5.1; 6.14). Esta discrepância é mais aparente que real. E facilmente explicada quando se considera que Berequias morreu antes de Ido e Zacarias sucedeu seu avô na chefia da ordem sacerdotal de Davi.1 Há vários exemplos no Antigo Testamento em que os homens são chamados filhos de seus avôs (Gn 29.5; cf. Gn 24.47; 1 Rs 19.16; cf. 2 Rs 9.14,20). “Como nestes casos”, observa George Adam Smith, “o avô era considerado o fundador da casa, assim, no caso de Zacarias, Ido era o chefe de sua família quando saiu da Babilônia e estabeleceu-se novamente em Jerusalém”. O fato de Esdras referir-se a Zacarias como filho de Ido deve ser entendido no sentido geral de descendente. Em todo caso, este profeta era membro da família sacerdotal de Ido, que voltou da Babilônia para Jerusalém sob as ordens de Ciro (Ne 12.4). O livro de Neemias acrescenta a observação de que no sumo sacerdócio de Joiaquim, filho de Josué, Zacarias foi nomeado chefe da casa de Ido (Ne 12.10,16). Se este é o profeta que intitula este livro, como é razoável supor, então era jovem em 520 a.C. e criança quando foi para Jerusalém numa caravana da Babilônia. O livro de Esdras nos informa que Zacarias compartilhava com Ageu o trabalho de animar Zorobabel e Josué a reconstruírem o Templo (Ed 5.1,2; 6.14). A carreira profética de Zacarias começou “no oitavo mês do segundo ano de Dario” (1.1), que é em novembro de 520 a.C. A primeira fase de seu ministério durou até o nono mês do quarto ano do reinado do rei, ou seja, até dezembro de 518 a.C. (7.1). Nada sabemos sobre os anos restantes da vida ou ministério do profeta, com exceção da declaração de nosso Senhor de que foi morto “entre o santuário e o altar” (Mt 23.35).


O Livro

A unidade do livro é seriamente questionada pelos estudiosos. As duas divisões principais - capítulos 1 a 8 (designados neste comentário por Zacarias I); e os capítulos 9 a 14 (que chamaremos Zacarias II) - são tão dessemelhantes em estilo e ponto de vista histórico que tornou-se comum atribuir a cada uma destas divisões um autor diferente. Zacarias I é composto de profecias datadas segundo os anos do reinado de Dario I Histaspes, do segundo ao quarto ano (520-518 a.C.). Nesta divisão, Dario ainda reinava quando o exílio terminou (1.12; 7.5). No entanto, muitos judeus estão na Babilônia (2.6); outros se espalharam pelo mundo (8.7). A comunidade em Jerusalém é pequena e fraca, formada principalmente por jovens e pessoas de meia-idade que vieram da Babilônia; há poucas crianças e pessoas idosas (8.4,5). Josué e Zorobabel são os chefes eclesiásticos e políticos da comunidade (3.1-10; 4.6-10; 6.11-15). Os alicerces do Templo estão assentados, mas o término da construção está no futuro (4.6-10). Contudo, à medida que o livro se desenrola, em dezembro de 518 a.C. o santuário fica suficiente mente pronto para que os sacerdotes já estejam nele (7.3). Não há mais necessidade de se fazer os jejuns do exílio (7.5-7; 8.18,19). O futuro é alvissareiro com as esperanças messiânicas (8.20-23). Acima de tudo, os árduos reveses com a natureza acabaram e as pessoas têm tempo de erguer os olhos e ver as nações que vêm de longe para adorar em Jerusalém (8.20-23). 

Estas características não deixam dúvida de que os primeiros oito capítulos do livro são do próprio profeta e do período ao qual ele os data: novembro de 520 a.C. a dezembro de 518 a.C. Quando passamos para o capítulo 9 percebemos que estamos numa situação histórica completamente diferente, e o ambiente está em nítido contraste com os capítulos 1 a 8. Os israelitas enfrentam um novo conjunto de forças históricas, e as palavras que lhes são dirigidas revelam um espírito diferente. Não há referência à construção do Templo ou sequer uma única reflexão sobre os acontecimentos sob cuja pauta Zacarias I foi escrito. Encontramos nomes de potências pagãs não mencionados na primeira divisão: Damasco, Hadraque, Hamate, Assíria, Egito e Grécia. A paz e a forte afeição pela paz, características tão proeminentes em Zacarias I, estão ausentes. 

A guerra, se ainda não começou, é iminente. Por estas e outras razões, a atual crítica bíblica, sobretudo a pertinente ao estilo, designa Zacarias II a outro autor. Em 1683, Joseph Mede promoveu a ideia que se tornou conhecida por teoria do pré-exílio concernente à autoria de Zacarias II. Afetado pelos fatos acima e movido pelo desejo de defender a correção de Mateus ter atribuído a passagem de Zacarias 11.12,13 ao profeta Jeremias (ver Mt 27.9,10), Mede designou Zacarias II a uma data anterior ao exílio. Acreditava, também, que muitas coisas na primeira divisão aplicavam-se melhor ao tempo de Jeremias do que ao de Zacarias. A opinião ganhou ampla aceitação, e, em fins do século XIX, muitos intérpretes reputavam que Zacarias II fosse uma coletânea de profecias referentes ao pré-exílio ligadas acidentalmente à profecia do pós-exílio de Zacarias. Embora Grotius (1644) e H. Corrodi (1792) se opusessem à teoria do pré-exílio de Mede e apresentassem argumentos a favor de uma data posterior de Zacarias II , foi Bernard Stade quem virou o curso da crítica ao que hoje é conhecido por teoria pós alexandrina. Em 1881, Stade publicou um artigo no qual demonstrou, através de um estudo de relações literárias e indicações históricas, que estes capítulos não podiam ser anteriores a Ezequiel. 

Seu ponto de vista era que Zacarias II foi escrito durante as guerras dos diádocos (cada um dos generais que disputaram entre si o controle do império de Alexandre, o Grande, após sua morte), de 323 a.C. a cerca de 278 a.C. Na atualidade, a erudição bíblica está dividida entre os que defendem a unidade do livro inteiro, ao datar Zacarias II depois de 480 a.C. em vista de 9.13 aludir à ameaça da Grécia, e os que colocam a segunda divisão no período grego ou pós-alexandrino (depois de 330 a.C.). Aqueles que advogam a primeira opinião entendem que Zacarias II é da lavra do profeta em seus anos de velhice. Os defensores da visão pós-alexandrina, embora não concordem em uma teoria única da data da composição (datam Zacarias II diversamente de 333 a.C. a 140 a.C.), têm necessariamente de rejeitar a autoria de Zacarias da segunda divisão do livro. 


Unidade

A erudição bíblica conservadora levanta sérias objeções à teoria pós-alexandrina e pós-zacariana de Zacarias, e firma-se nos seguintes fundamentos:

1) O argumento mais forte aduzido a favor da teoria pós-alexandrina é a referência aos filhos da Grécia em 9.13. Na época, pensava-se que os gregos fossem uma ameaça contra Sião e os consideravam potência mundialmente dominante. No entanto, a profecia é de derrota, não de vitória, para os filhos da Grécia. Além disso, a passagem de 9.12,13 não descreve uma batalha, mas profetiza um faturo confronto entre Sião e a Grécia, do qual os judeus sairiam triunfantes. Nos dias de Zacarias, as vitórias gregas sobre Xerxes em Salamina, Plateia e Micale (480-479 a.C.) seriam suficientes para colocá-las na atenção de seus contemporâneos. Amenos que rejeitemos a possibilidade da predição profética em base dogmática, não há motivo para Zacarias não poder ter escrito estas palavras na década de 470 a.C.

2) O argumento literário também foi abordado. Os críticos afirmam que o estilo de Zacarias II difere de Zacarias I. A frase: “Assim diz o Senhor”, tão frequente nos capítulos 1 a 8, ocorre apenas uma vez na segunda divisão. Por outro lado, a expressão “naquele dia” é usada 18 vezes em Zacarias II contra somente quatro ocorrências em Zacarias I. Ademais, dizem que o estilo da última seção é mais poético. Contudo, os estudiosos conservadores mostram que há características de estilo até mais significativas que são comuns a ambas as seções. É de comum acordo que o estilo de um autor muda com o transcurso dos anos e ao tratar de uma situação histórica diferente. Nos dias em que o profeta convocava os compatriotas judeus a reconstruir o Templo, a frase profética: “As sim diz o Senhor” era necessária para reforçar a autoridade divina da convocação. Por outro lado, a expressão escatológica “naquele dia” é mais apropriada em profecias que olham o futuro mais distante de Israel, o tema de Zacarias II. Os defensores da unidade da autoria de Zacarias ressaltam a persistência das seguintes características estilísticas: 

a) A expressão: “Diz o Senhor”, ocorre 27 vezes em Zacarias I e sete vezes em Zacarias II.

b) A frase hebraica traduzida com o sentido de “os olhos do Senhor” ocorre duas vezes em Zacarias I (4.10; 8.6) e uma vez em Zacarias II (9.8; duas vezes se aceitarmos 12.4: “os meus olhos”). 

c) O título divino: “O Senhor dos Exércitos”, é encontrado 46 vezes, ou seja, 38 na primeira divisão e oito na segunda. 

d) O verbo hebraico traduzido por “habitar”, no sentido especial de “estar habitado”, “estar povoado”, “estar instalado”, acha-se duas vezes em cada divisão e muito raramente em qualquer outro lugar do Antigo Testamento. 

e) Há um tipo peculiar de paralelismo hebraico dividido em cinco partes que ocorre escassamente fora de Zacarias, mas que aparece uma vez em Zacarias I (6.13) e três em Zacarias II (9.5,7; 12.4). No que tange ao idioma, todos os estudiosos concordam que o hebraico em ambas as partes de Zacarias é puro e notavelmente livre de aramaísmo. 

Pusey observa: “Em ambas as divisões há certa completude de linguagem, produzida pela insistência no mesmo pensamento ou palavra: em ambas as seções, o todo e suas partes são, para dar ênfase, mencionados juntos. Em ambas as partes, como conseqüência desta completude, ocorrem a divisão do versículo em cinco porções, ao contrário da regra habitual do paralelismo hebraico”.

3) Por fim, temos de observar que aqueles que rejeitam a autoria de Zacarias dos capítulos 9 a 14 estão em discordância extrema e incorrigível entre si concernente a uma teoria alternativa. As referências nos capítulos 9 a 14 conduzem a diversas datações de suas diversas partes integrantes, variam desde aproximadamente 330 a 140 a.C., e de pendem de quais correlações sejam feitas com episódios e personagens ligados com a história helenística. As dessemelhanças aceitas entre Zacarias I e Zacarias II podem ser tratadas sem comprometer a convicção na unidade da autoria. Collins expressou bem a idéia: [...] Nos capítulos 1 a 8, o profeta preocupa-se primariamente com os aconteci mentos contemporâneos, particularmente com a reconstrução do Templo; ao passo que nos capítulos 9 a 14, lida com os acontecimentos futuros, como a vinda do Messias e a glória de seu reinado. Por conseguinte, é natural que a primeira divisão seja de estilo histórico, enquanto que a última, de estilo apocalíptico. Outrossim, é provável que a primeira parte da profecia pertença à vida do jovem Zacarias, e a segunda à sua idade avançada. As evidências internas do livro são favoráveis, como mostra tão claramente W. H. Lowe, à origem pós-exílica de ambas as divisões e à unidade de autoria. 

Interpretação: Zacarias 1 Zacarias 2 Zacarias 3 Zacarias 4 Zacarias 5 Zacarias 6 Zacarias 7 Zacarias 8  Zacarias 9 Zacarias 10 Zacarias 11 Zacarias 12 Zacarias 13 Zacarias 14

Aspectos Literários

Com base no estilo e no conteúdo, o livro divide-se claramente em duas partes, Zac. 1–8 e 9–14. A primeira seção inclui uma série de oito visões noturnas (1:8–6:8) e oráculos referentes à restauração de Jerusalém e Judá (6:9–8:23). O segundo é em grande parte de natureza apocalíptica, concernente ao Dia do Senhor e ao final da era atual. A maioria dos estudiosos críticos vê a última parte como uma adição posterior, no quinto ou quarto século ou até mesmo na terceira; talvez devido ao descontentamento das pessoas com a liderança existente da comunidade de restauração, também poderia, segundo a visão conservadora, ressentir-se da visão moderada de um Zacarias maduro. Os dois oráculos (cf. superscrições para 9:1; 12:1; Heb. (maśśā˒) são freqüentemente associados ao livro de Malaquias (cf. Mal. 1:1).

Conteúdo

Um chamado profético de abertura ao arrependimento é datado de Marcheshvan (outubro/novembro) 520 a.C. (Zacarias 1:1-6). A primeira das oito visões noturnas, datadas de Shebat (janeiro/fevereiro) 519 a.C., retrata cavaleiros divinos que patrulham a Terra, uma promessa de restauração (vv. 8-17). Na segunda (vv. 18-21 [MT 2:1–4]), quatro chifres (as nações poderosas que dispersaram Judá e Israel) ficarão “aterrorizados” por quatro ferreiros, os agentes do Senhor. Zac. 2:1-5 (MT 5–9) diz respeito à restauração (medição) de Jerusalém, a ser protegida pela glória do Senhor. Nesse sentido, em vv. 6–13 (MT 10–17) o profeta apela aos exilados para fugirem da Babilônia e fugirem para Sião. Julgado para ser digno (“limpo”), o sumo sacerdote Josué recebe a responsabilidade na quarta visão (cap. 3) para os aspectos religiosos e civis da comunidade de restauração.

Na quinta visão (cap. 4), tanto Josué quanto Zorobabel (“os dois ungidos”) compartilham a responsabilidade pela comunidade recém-unificada (um candelabro de ouro). Em 5:1-4, um pergaminho voador representa a maldição de Deus sobre todos os que roubam ou juram falsamente; vv. 5–11 proclama a purificação de Judá, a ser cumprida despachando seu pecado (personificado como Iniquidade; uma mulher em uma efa) para a Babilônia. A visão final (6:1-8) é uma reminiscência do primeiro; quatro carros e seus cavalos patrulham a terra em preparação para o advento da era messiânica.

Zac. 6:9–8:23 contém uma série de oráculos sobre a era messiânica. O primeiro (6:9-15) prediz a coroação do rei messiânico. Cap. 7, datado de Chislev (nov./dez.) 518 a.C., enfatiza a implementação do ideal ético profético (vv. 9-10) como mais apropriado para a comunidade de restauração do que a preocupação anterior com o ritual (cf. 8:19b). Cap. 8 compreende dez declarações proclamando a restauração de Jerusalém e Judá, com paz e prosperidade para toda a humanidade.

Os capítulos finais representam duas coleções de enunciados poéticos e de prosa sem data. Aqueles contidos no primeiro oráculo (caps. 9–11) enfocam a restauração de Israel:a humilhação dos que são hostis a Israel (9:1–8; 11:1–3), o ajuntamento do povo disperso de Deus (9:11–17) e a soberania do Senhor sobre a natureza e a história (cap. 10). Zac. 11:4-17 é uma alegoria de dois pastores (reis), um rejeitado por suas ovelhas e o outro antipático às suas necessidades. O segundo oráculo (caps. 12–14) diz respeito ao vindouro Dia do Senhor quando as nações serão destruídas em seu último assalto a Jerusalém (cap. 12) e a cidade expurgada da idolatria (13:1–6). Cap. 14 apenas um remanescente de Jerusalém escapou, e os gentios sobreviventes se apresentaram perante o Senhor.

Resumo: Zacarias 1 Zacarias 2 Zacarias 3 Zacarias 4 Zacarias 5 Zacarias 6 Zacarias 7 Zacarias 8 Zacarias 9 Zacarias 10 Zacarias 11 Zacarias 12 Zacarias 13 Zacarias 14

Teologia

Subjacente à profecia do livro de Zacarias está uma clara compreensão de Javé como soberano na criação (10:1-2) e história (por exemplo, 4:6-10; 10:3-12), particularmente vívida nas representações do apocalipse. Dia do Senhor (por exemplo, 2:11–12 [MT 15–16]; caps. 12–14). Em harmonia com o pacto histórico de Israel, ele abençoa seu povo pela adesão às suas estipulações e amaldiçoa sua desobediência (por exemplo, 1:2–6; 2:8–12 [MT 12–16]; 10:6). Apesar da preocupação do profeta com a reconstrução do templo (por exemplo, 1:16; 6:12; 8:10), em termos da aliança, ele busca os ideais maiores de unidade (cf. 3:10; 4:2 e moral). comportamento (7:9-10).

De particular importância é o interesse de Zacarias no rei messiânico, um justo “Ramo” (3:8, “meu servo”), um descendente da casa de Davi (12:7–8) que “(re)construirá o templo do Senhor “(6:12-13). Apresentado como um príncipe de “paz” (9:9–10), ele é visto como um pastor “condenado a ser morto” (11:7ss, 13:7–9). Essa imagem ressalta o retrato do Novo Testamento de Jesus como Messias (por exemplo, Mateus 21:1-11 par., Com base em Zacarias 9:9-10; cf. Mt 26:14 e Zc 11:12).

Bibliografia
J. G. Baldwin, Haggai, Zechariah Malachi. Tyndale (1972); R. A. Mason, The Books of Haggai, Zechariah and Malachi. CBC (1977), pp. 27–134; D. L. Petersen, Haggai and Zechariah 1–8. OTL (1984).